Petição contra o alargamento do IC20
Para: Exmo. Sr. Ministro das Infraestruturas, João Galamba, Exmo. Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática, Duarte Cordeiro, Exmo. Sr. Secretário de Estado das Infraestruturas, Frederico Francisco, Exmo. Sr. Secretário do Estado da Mobilidade Urbana, Jorge Delgado, Exma. Sra. Presidente da CCDRLVT, Teresa Almeida, Exmo. Sr. Presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta,
Exmo. Sr. Ministro das Infraestruturas, João Galamba,
Exmo. Sr. Ministro do Ambiente e da Ação Climática, Duarte Cordeiro,
Exmo. Sr. Secretário de Estado das Infraestruturas, Frederico Francisco,
Exmo. Sr. Secretário do Estado da Mobilidade Urbana, Jorge Delgado,
Exma. Sra. Presidente da CCDRLVT, Teresa Almeida,
Exmo. Sr. Presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, Nuno Lacasta,
A população foi surpreendida na reunião de Câmara Municipal de Almada, do dia 18 de Setembro de 2023, em plena Semana Europeia da Mobilidade, com informação sobre o alargamento do IC20 para 4 vias por sentido, conforme consta nos media locais [1,2]. Esta obra é um compromisso que resulta de um contrato caduco, que deveria já ter sido renegociado pelo Estado junto da concessionária Baixo Tejo, de modo a ir ao encontro daquilo que são os objetivos estabelecidos a nível ambiental.
Serve esta petição para objetar contra a intervenção para aumento do número de vias do IC20, pelas razões enumeradas abaixo:
- Esta intervenção vai contra a estratégia climática nacional, que vincula o país a reduzir as emissões de gases com efeito de estufa (GEE) promovendo a utilização de transportes menos poluentes, em vez de promover a utilização automóvel.
- A solução apresentada não irá resolver o problema de congestionamento do IC20 em direção a Lisboa ou vice-versa. A capacidade deste troço é determinada pela capacidade da Ponte 25 de Abril, e só estamos a abrir mais vias de um funil.
- Há já várias décadas que estudos demonstram que aumentar o número de vias fará com que o volume de carros aumente, não solucionando a questão do congestionamento. Uma vez aumentada a capacidade, rapidamente será preenchida, até atingir os níveis de congestionamento atuais. Este fenómeno, amplamente estudado, é denominado de “procura induzida” [3,4,5].
- Alargar a capacidade rodoviária é não apenas uma medida obsoleta num contexto de emergência climática, mas também inútil, já que os principais constrangimentos resultam das zonas onde a capacidade rodoviária afunila. O efeito de "bottleneck" tende mesmo a aumentar, já que mais automóveis chegarão a um mesmo estrangulamento, que ocorre nas horas de ponta de utilização da IC20, nas suas artérias principais de acesso às localidades (Costa >Almada>Lisboa>Almada>Costa). Vai ocorrer mesmo com 4 vias, pois a sobrecarga vai apenas acumular-se em mais uma fila (em vez de 300 carros parados teremos 400) [6].
- O alargamento de vias rápidas torna o desenvolvimento urbano local mais disperso, fragmentado e frágil e impossibilita que outros meios de transporte, para além do carro, possam realmente funcionar enquanto solução de mobilidade.
Optar por esta solução é encorajar o aumento do número de veículos em circulação, incentivando a utilização do automóvel em áreas urbanas que já se encontram no seu limite.
Esse incentivo é dissonante face à urgência de reduzirmos as emissões de GEE; incentiva a poluição e o sedentarismo; é contrária à economia das famílias que, reféns de uma mobilidade assente no automóvel, gastam parte substancial dos seus rendimentos para o alimentar; e contribui para uma acessibilidade profundamente desigual, já que “o carro não é um meio de transporte universal. E se o meio urbano “está desenhado para o automóvel” então há muita gente excluída [7].
Face ao exposto, solução para a melhoria da acessibilidade a pessoas, bens e serviços naquele território não deve passar por facilitar o acesso automóvel, mas sim, por diversificar as formas de acesso à Costa da Caparica, melhorando as redes de transportes públicos, o acesso a pé e de bicicleta e a interligação entre os vários modos de transporte que compõem um sistema de mobilidade sustentável.
Enquanto moradores e frequentadores do concelho de Almada, exigimos transparência e bom uso do dinheiro público e uma aposta clara numa mobilidade sustentável e ativa, melhorando os transportes públicos e a mobilidade ciclável. Eis as medidas que consideramos prioritárias a serem executadas em território Almadense e para as quais deverão ser feitos investimentos financeiros públicos:
- Prolongamento da linha do MTS - Metro Transportes do Sul, desde a Universidade até à Costa da Caparica e Trafaria.;
- Renovação da frota dos barcos da TTSL - Transtejo Soflusa e melhoria do serviço, de modo a reaver a confiança neste serviço que foi perdido ao longo dos últimos anos, perante sucessivas falhas e inexistência de serviço previsto, assim como aumento da frequência e alargamento do horário dos barcos da Trafaria, permitindo fazer uma ligação mais eficaz a Lisboa;
- Melhoria da ligação ferroviária na ponte 25 de Abril pela Fertagus por via do aumento da frequência e do número de carruagens por composição e alargamento do serviço desde Setúbal até ao Oriente, dado que actualmente vai apenas até Roma-Areeiro.
- Alargamento da rede ciclável desde Almada até à Costa da Caparica e requalificação da ciclovia Trafaria - Costa da Caparica, que está em avançado estado de degradação;
- Requalificação dos percursos pedonais existentes e que permitem efetuar a saída e a entrada na Costa da Caparica pelas pessoas que quotidianamente necessitam de fazer esse percurso a pé, nomeadamente estudantes e trabalhadores.
- Melhoria da acessibilidade, baseada nas pessoas com deficiência física e visual, nos acessos pedonais de e para a Costa da Caparica, Trafaria e Almada, ligando, também, às restantes localidades entre estas, promovendo o acesso facilitado aos transportes públicos.
Face ao compromisso do governo de promover a descarbonização dos transportes, para além do conjunto de medidas de política sugeridas, é fundamental envolver os cidadãos nos processos de decisão para que possam compreender os desafios em causa e dar pistas de como se podem mudar os padrões de mobilidade. Dificilmente se alcançarão as metas da Estratégia de Mobilidade Ativa Ciclável e Pedonal sem a participação dos cidadãos e o seu comprometimento em torno das ações a implementar.
Queremos uma Almada do futuro e não do passado, pelo que também exigimos que qualquer intervenção desta natureza implique a consulta dos/as habitantes, bem como das organizações especializadas em matéria ambiental.
Assinamos por isso, a petição contra o alargamento do IC20 para 4 vias!
Almada, 22 de Setembro de 2023
Subscrevem esta petição:
- Centro de Arqueologia de Almada
- Estrada Viva
- Estuário Colectivo
- FPCUB - Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta
- GEOTA - Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente
- MUBi - Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta
- Mulheres na Arquitectura
- QUERCUS - Núcleo Regional de Setúbal
- the Future Design of Streets Association
Algumas referências que sustentam esta petição:
[1] - Ligação de Almada à Costa da Caparica: IC20 vai ser alargado, passando de três para quatro vias, in Jornal Almadense: https://almadense.sapo.pt/mobilidade/ligacao-de-almada-a-costa-da-caparica-ic20-vai-ser-alargado-passando-de-tres-para-quatro-vias/
[2] - Almada | Alargamento do IC20 começa em Outubro, Almada online: https://almadaonline.pt/almada-alargamento-do-ic20-comeca-em-outubro/
[3] - O TRÁFEGO INDUZIDO foi definido pelo relatório seminal The Standing Advisory Committee on Trunk Roads Assessment (1994) Trunk Roads and the Generation of Traffic. Report for DfT, Chairman Mr D A Wood, QC, December 1994, como "o aumento de tráfego de veículos que não teria ocorrido sem o aumento da capacidade da rede". Desde então, muitos estudos e relatórios demonstraram o fenómeno da Indução de Tráfego, sendo um dos mais recentes WSP and Rand Europe (2018) Latest Evidence on Induced Travel Demand: An Evidence Review. Report for DfT, May
[4] - Induced traffic: yet again a worryingly overlooked dimension in crucial road planning and appraisal policy: https://tapas.network/35/hopkinsongoodwin.php
[5] - Estudos da University Transportation Center da Universidade da Califórnia - https://ncst.ucdavis.edu/research-product/induced-vehicle-travel-environmental-review-process
[6] - The fundamental law of road congestion: evidence from US cities: www.nber.org/system/files/working_papers/w15376/w15376.pdf
[7] - O problema urbanístico é de espaço: https://fumaca.pt/david-vale-sobre-mobilidade-e-dependencia-automovel/
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