Criação do Ministério do Desporto

Não pretendo mimetizar o padre António Vieira, pregador do acutilante Sermão de Santo António aos Peixes, no qual verbera, com aspereza destemperada, os peixes graúdos desta era: os soberbos e arrogantes (roncadores); os pregadores (parasitas e oportunistas); os ambiciosos (voadores); os hipócritas e traidores (polvos), estes na essência traiçoeiros, maldosos e hipócritas.
A culpa, na ótica do Padre Vieira, ou responsabilidade, na minha, da falta da importância social do desporto é das pessoas do desporto, seja porque não se prega a verdadeira doutrina, ou porque se diz uma coisa e faz outra, ou porque se tende a pregar não a Cristo, mas a outros interesses paladinos. Se quisermos ser benévolos podemos sempre dizer que a culpa está na água, porque os ouvintes, peixes, não querem receber a doutrina, ou antes preferem imitar os pregadores e não o que eles dizem, servindo os seus apetites e não os que se perseguem.
Nada contra a cultura. Aliás a cultura é determinante num país de provincianismos bacocos. Mas se a cultura tem direito a um ministério, também pelo simbolismo que isso representa e pelo mesmo provincianismo bacoco, o desporto terá de ter um.
Como estamos na era dos roncadores, vamos também roncar e voar com a ambição que nos caracteriza.
Pode ser que o próximo putativo indigitado tenha tempo de almoçar com 100, pelo menos, personalidades da área do desporto com alguma profusão social e mediática para justificar o peso do desporto em termos sociais. Pode ser que assim e só assim:
1. Decidam acabar de vez com a agregação clássica do desporto e Juventude. Num País que caminha para a inversão da sua estrutura etária com a baixa taxa de natalidade e alargamento do topo da pirâmide traduzindo uma baixa na mortalidade e consequente aumento da esperança de vida, mais se justifica uma agregação do desporto e seniores, mais do que juventude.
2. Reafirmem o papel do desporto nos dias de hoje. A vida biológica poderá vir a ser prolongada e até certa forma marcada, mas a morte nunca será evitada: o desafio está precisamente na qualidade desta vida. Na nossa atividade, o progresso para além de relevância técnica, tem relevância ontológica: o enhancement (potenciação) de um ciclo de vida.
3. Considerem o desporto como uma mais-valia inestimável e uma oportunidade perante a sociedade globalizada, de se afirmar como um fator pacificador e promotor de grandes causas sociais do desenvolvimento.
4. Considerem definitivamente o desporto como uma das possíveis, eventualmente a principal, objetivação cultural, pela valorização do carácter fundamental do corpo motor, pois é sobre ele que se instala e se funde o corpo desportivo que assim lhe confere significado e que não encontrou o seu devido valor pela falha na avaliação do seu retorno, quer educativo, quer social, quer de saúde, quer económico, quer estrutural.
Por isso e por tudo mais o Desporto merece um Ministério. Nem que seja da Fé.

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