Suspensão do Ano Lectivo para todos os Alunos e Escolas
Para: Ministro da Educação; Presidente da Assembleia da República
No âmbito do encerramento das escolas decorrente da situação epidemiológica provocada pelo novo coronavírus SARS-CoV-2 e da previsão de que o terceiro período poderá ser passado em casa, com recurso a metodologias de ensino à distância para dar continuidade aos processos de aprendizagem, as pessoas signatárias desta petição consideram que este ano lectivo deveria ficar suspenso até que as escolas possam retomar a sua actividade normal e que, em concordância, todos os exames e provas de aferição sejam adiados.
Estamos a viver uma situação social grave e excepcional, de saúde pública, com uma série de implicações para as famílias, tanto do ponto de vista financeiro, laboral e logístico, como do ponto de vista emocional, em que assistimos a um esforço constante de readaptação dos cidadãos a esta nova realidade. Não podemos pretender que a escola seja exceção, pelo que dar prioridade à continuidade dos conteúdos programáticos dos alunos em casa, como se fosse possível manter uma aparente normalidade e cumprir o 3ºperiodo escolar neste contexto, é um adicionar inimaginável de pressão e de stresse para as famílias.
O ensino à distância levará também a um acentuar das desigualdades sociais já existentes, prejudicando alunos com situações sócio-económicas mais frágeis, com menor aproveitamento ou com NEE. Isto subverte completamente o que se pretende da escola: que seja inclusiva e capaz de esbater desigualdades sociais.
Desta forma, julgamos que o modelo de ensino à distância implicando meios e recursos que nem todas as famílias possuem, é inconstitucional por violar os direitos das crianças e o princípio à igualdade, nomeadamente pelo seguinte:
- há estudantes que não têm computador nem acesso à Internet em casa;
- mesmo nas famílias que têm computador e internet, estes podem ser necessários para o teletrabalho;
- há famílias com várias crianças, com idades e necessidades diferentes e que entre tarefas domésticas, teletrabalho e gestão dos diferentes elementos da família, não terão tempo nem recursos para todos/as;
- há professores que, estando também em situação de isolamento, têm eles próprios as suas famílias para cuidar, não estando nas condições necessárias para se dedicarem aos seus alunos da mesma forma com que o fazem nas escolas;
- há famílias em que só há um elemento adulto;
- há famílias em que os/as adultos/as continuam a trabalhar fora de casa;
- nem todas as famílias têm conhecimentos ou capacidades que lhes permitam acompanhar os currículos escolares dos/as estudantes;
- há famílias com crianças com necessidades educativas especiais que necessitam de apoio de profissionais especializados para as suas aprendizagens (e que as famílias sozinhas não conseguem assegurar);
- há famílias com crianças com diversidade funcional ou neurodiversidade que, entre todas as outras tarefas, têm agora que assegurar todo o tipo de “terapias” em casa, tendo perdido o apoio e acompanhamento de profissionais e precisando de lutar para manter as suas crianças compensadas;
Sugerimos, no entanto, que se criem, mantenham e estimulem com regularidade canais de comunicação entre docentes, estudantes e as suas famílias, assim como entre os grupos de pares da escola. Podem ser promovidas actividades e formas de interação que façam com que os alunos e as famílias se sintam acompanhadas No contexto actual que vivemos, a prioridade deverá ser assegurar que as famílias se sentem apoiadas nesta fase difícil e com consequências imprevisíveis para os seus núcleos. Alguns meses sem conteúdos programáticos não se reflectirão em nada num percurso de 12 anos de escolaridade. Já esses mesmos meses com famílias diariamente stressadas, pressionadas e em condições muito diversas umas das outras, irá certamente prejudicar gravemente e a longo prazo um sem número de crianças e jovens.
As pessoas signatárias:
Ana Rita Dias - Mãe, Psicóloga Clínica
Filipa Rua - Mãe, Psicóloga da Justiça
Sara Rego - Mãe, Licenciada em Ciências da Educação e Formadora em Pedagogia Montessori
João Martins - Pai, Presidente da Associação de Pais do Agrupamento de escolas de Vouzela
