Advogados e Juristas Portugueses reclamam Cessar-Fogo Imediato em Gaza
Para: Advogados e Juristas Portugueses
Nós, advogados e juristas portugueses abaixo-assinados, apelamos aos nossos governantes e aos povos do mundo: que se quebre o silêncio.
Que se ponha fim à inação perante o horror.
Alguns comoveram-se e tocaram-se com o genocídio e perseguições que o povo judeu foi alvo ao longo de vários séculos, com a expulsões, escravizações e o ápice dessa forma de preconceito que se deu durante o Holocausto — período em que mais de seis milhões de judeus foram mortos nos campos de concentração, além de milhões de prisões e violações dos direitos civis judaicos promovidas pelo nazismo de Adolf Hitler.
Outros apoiaram e tocaram-se com a causa palestiniana e defenderam a criação de um Estado da Palestina.
Mas hoje o que está em causa vai muito além disso. Não é qualquer antissemitismo nem preconceito, hostilidade ou discriminação contra judeus. Também não é a defesa de Um Estado da Palestina ou dos direitos do povo palestiniano.
Trata-se da destruição de toda a sociedade, das suas casas, dos seus edifícios, das suas escolas, dos seus hospitais, da sua arqueologia, das suas ruas. Da falta de comida, água, electricidade, em suma, da aniquilação de uma população.
Há um ano e sete meses, a poeta palestiniana Hiba Abu Nada foi morta por bombardeamentos israelitas. No seu poema “Uma Estrela Disse Ontem”, imaginava um refúgio cósmico para Gaza - um lugar seguro, longe da morte:
“E se um dia, ó Luz,
Todas as galáxias
De todo o universo
Já não tivessem lugar para nós,
Dirias: ‘Entra no meu coração,
Aí estarás finalmente seguro.’”
Hoje, o que se passa em Gaza é de uma brutalidade sem freio.
Já não há debate entre juristas ou organizações de direitos humanos: o que se passa em Gaza é muito grave. A Amnistia Internacional, os Médicos Sem Fronteiras, a Human Rights Watch, a Federação Internacional dos Direitos Humanos, o Conselho de Direitos Humanos da ONU e muitos outros confirmam-no.
Mais de 40 peritos independentes da ONU afirmaram recentemente: “Enquanto os Estados discutem palavras — é ou não é genocídio? — Israel continua a destruir vidas em Gaza, por terra, ar e mar, deslocando e massacrando a população sobrevivente com impunidade. Ninguém é poupado — nem crianças, nem pessoas com deficiência, nem mães, jornalistas, profissionais de saúde, trabalhadores humanitários ou reféns.”
Morrem centenas de pessoas por dia — e não interessa se são palestinianos ou judeus. São pessoas. E muitas delas crianças.
“A injustiça num lugar qualquer é uma ameaça à justiça em todo o lugar.”
- Martin Luther King Jr.
E essas pessoas não são vítimas abstratas de uma guerra abstrata. Palavras têm sido usadas para justificar o injustificável. E as palavras certas — as que importam — têm sido silenciadas, tal como os que as poderiam escrever.
“A primeira vítima da guerra é a verdade.” - Aeschylus
“Genocídio” não é um slogan. É uma palavra com peso legal, político e moral. Tal como é verdade que os ataques do Hamas a civis inocentes em 7 de Outubro de 2023 foram crimes de guerra e contra a humanidade, também é verdade que o que Israel faz hoje em Gaza são crimes de guerra contra a humanidade — com crimes de guerra e contra a humanidade, cometidos diariamente pelas Forças de Defesa de Israel sob ordens do governo israelita.
“Nunca duvidem de que um pequeno grupo de cidadãos conscientes e empenhados pode mudar o mundo. De facto, é a única coisa que alguma vez o conseguiu.” - Margaret Mead
Alexis Deswaef, vice-presidente da Federação Internacional dos Direitos Humanos, recordou o conceito de “espectador-aprovador”, usado no tribunal da ex-Jugoslávia: o responsável que assiste em silêncio, e cujo silêncio é lido como aprovação pelos agressores.
Recusamo-nos a ser esse público. Isto não é apenas sobre direitos humanos. É sobre a nossa dignidade moral enquanto juristas do nosso tempo. E ela diminui a cada dia que calamos.
“O mundo não será destruído por aqueles que fazem o mal, mas por aqueles que observam e nada fazem.” - Albert Einstein
Ao tomarmos esta posição, afirmamos sem reservas a nossa oposição ao antissemitismo, ao preconceito contra judeus e israelitas. Rejeitamos o ódio e a violência — contra palestinianos, israelitas e judeus — em todas as formas. Estamos solidários com todos os que resistem às políticas do atual governo de Israel — sejam palestinianos, judeus ou israelitas.
Apelamos a todos para que se juntem a este clamor por compaixão, razão e mediação. Pelos quase 54 mil mortos em Gaza. Pelos sobreviventes — famintos, feridos, marcados para sempre:
1. Pedimos a distribuição imediata e sem restrições de alimentos e ajuda médica em Gaza, sob coordenação da ONU.
2. Pedimos que se imponham sanções ao Estado de Israel, caso o governo israelita ignore este apelo — que é também o apelo do mundo — por um cessar-fogo imediato.
3. Pedimos um cessar-fogo que garanta segurança e justiça para todos os palestinianos, a libertação de todos os reféns israelitas e a libertação dos milhares de prisioneiros palestinianos detidos arbitrariamente.
“Se és neutro em situações de injustiça, escolheste o lado do opressor.”
- Desmond Tutu
Esta guerra compromete-nos a todos. Somos testemunhas. E recusamo-nos a ser cúmplices pelo silêncio.
Autoria: Nuno Albuquerque, 3658-P.