Petição Pública para Avaliação da Inconstitucionalidade do Partido Chega
Para: Exmo. Sr. Procurador-Geral da República Exmos. Senhores Juízes do Tribunal Constitucional
Nós, cidadãos e cidadãs portugueses, vimos por este meio apresentar petição pública urgindo à avaliação da constitucionalidade do Partido CHEGA. Tal urgência justifica-se pela convergência de eventos recentes que apontam para o grave desrespeito daquele partido pelos valores e normas essenciais da nossa democracia, expressos na Constituição da República Portuguesa (CRP). O partido CHEGA – segunda/terceira força política eleita no parlamento após as eleições legislativas de 18 de maio de 2025 – tem alardeado publicamente propostas e declarações que contrariam frontalmente os princípios fundamentais do Estado de Direito democrático. O presente documento reúne exaustivamente os factos e fundamentos pertinentes, demonstrando que o CHEGA tem tentado revisões constitucionais incompatíveis com valores constitucionais, normalizado discursos de ódio, racismo e misoginia, ameaçado direitos sociais (como o SNS e o ensino público), desrespeitado simbolicamente o 25 de Abril e a Constituição de 1976, e feito apelos autoritários contra adversários políticos e meios de comunicação. Fundamos esta petição nos artigos relevantes da CRP, notadamente os arts. 1.º, 9.º, 13.º e 46.º n.º 4, e em opiniões de constitucionalistas de renome (Jorge Bacelar Gouveia, Vital Moreira, entre outros). Cita-se ainda o exemplo de casos europeus análogos (como o processo NPD na Alemanha) para contextualizar o risco democrático em causa. Por fim, propomos medidas concretas de atuação: fiscalização sucessiva da constitucionalidade do partido, eventual ilegalização com base no art. 46.º n.º 4 CRP, criação de comissão parlamentar de avaliação e revisão dos critérios de legalização de partidos políticos.
A Constituição portuguesa consagra no Artigo 1.º que “Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária”. O Artigo 2.º afirma que a República é um “Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efetivação dos direitos e liberdades fundamentais”. O Artigo 9.º, alínea c), ainda, estabelece como tarefa fundamental do Estado “defender a democracia política” e “assegurar e incentivar a participação democrática dos cidadãos”, e na alínea d) preceitua promover o “bem-estar e a qualidade de vida do povo” e a “igualdade real entre os portugueses”. O Artigo 13.º, n.º 2, proclama o princípio da igualdade: “Ninguém pode ser beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito… em razão de… sexo, raça, … convicções políticas ou ideológicas, … condição social ou orientação sexual”. Em suma, a CRP exige que a organização política assente na liberdade, igualdade e solidariedade, proibindo expressamente qualquer discriminação por ascendência, raça, convicção ideológica, género, orientação sexual, etc.
Além disso, o Artigo 46.º, n.º 4, proíbe taxativamente “organizações racistas ou que perfilhem a ideologia fascista”. Esse dispositivo, ecoado pelo artigo 8.º da Lei dos Partidos, permite a extinção judicial de partidos políticos cujos fins contrariem o texto constitucional. A jurisprudência comparada mostra que tais normas excepcionais existem precisamente para “fixar os mínimos existenciais” da democracia, evitando a sua destruição interna . Como assinala o constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia, “a Democracia, como regime político, não é o regime do ‘vale tudo’ e tem de fixar os mínimos existenciais para evitar a sua destruição ‘por dentro’” . Em sua opinião, havendo indícios de comportamento incompatível com a ordem democrática, “deve ser suscitado processo no Tribunal Constitucional” . Com efeito, Bacelar Gouveia explica que, diante de sinais de ilicitude no discurso ou na atuação partidária, “é o Ministério Público, como defensor da ‘legalidade democrática’, que deve intentar ação no Tribunal Constitucional com vista à extinção do partido político que entenda estar nessas condições” .
O constitucionalista Vital Moreira também sublinha que a Constituição veda partidos racistas, embora – como o próprio destaca – seja “tolo pretender que existe hipótese de o TC avaliar o Chega como fascista” pura e simplesmente. Segundo ele, “só a proibição de organizações racistas poderia ser acionada no caso deste partido, a partir das declarações racistas do seu líder e da propaganda racista do partido”. De fato, a Constituição “não admite partidos racistas” – anomalia que raramente se vê em outras democracias e que Portugal optou por coibir explicitamente. Vital Moreira acrescenta que racismo e xenofobia constituem “violência e apologia da violência”, dando como exemplo os crimes cometidos por grupos como o grego Aurora Dourada. Em suma, os valores constitucionais de igualdade, dignidade e Estado Social (artigos 1.º, 9.º e 13.º) são sistematicamente violados pelas declarações e propostas do CHEGA.
Em síntese, a fundamentação jurídica clara do presente pedido assenta nos seguintes pontos principais:
• A CRP estabelece como alicerces do regime democrático os valores da dignidade humana, igualdade, liberdade e solidariedade.
• O CHEGA tem adotado retórica e propostas antitéticas a esses valores, exaltando preconceitos contra minorias, atacando direitos sociais (Saúde e Educação) e privilegiando discursos autoritários, o que colide com a ordem constitucional.
• O Art. 46.º, n.º 4 impõe proibição a partidos racistas ou fascistas. Mesmo que o CHEGA não se identifique formalmente como partido fascista, suas mensagens e práticas devem ser avaliadas globalmente para detectar indícios dessas ideologias proibidas . Como observa Bacelar Gouveia, não basta analisar apenas o programa escrito – “nunca (o TC) deve contentar-se com uma avaliação meramente formal do que se encontra escrito no programa ideológico”. É preciso considerar também as opiniões, declarações e atos de seus dirigentes.
• Juristas de referência apontam que, havendo sinais de atentado à ordem democrática, devem ser acionados os mecanismos previstos na CRP. Vital Moreira e Bacelar Gouveia defendem a ativação da norma constitucional antirracista (art. 46.º/4) e do procedimento de fiscalização sucessiva, para que o Ministério Público pugne pela extinção do partido em caso de inconstitucionalidade.
• A experiência comparada reforça esse entendimento. No caso do NPD (partido neonazi alemão), o Tribunal Constitucional da Alemanha reconheceu que a formação “despreza a dignidade humana” e contraria “os princípios democráticos”, mas não a proibiu por considerar que se trata de “formação sem peso” eleitoral. Esse precedente mostra que confiar apenas na força do voto não protege completamente a democracia: é necessário monitorar ativamente tais grupos e coibir ilegalidades mesmo antes que se transformem em violência de facto.
Diante desse quadro, exige-se cumprir o mister de defesa da Constituição. Como adverte Bacelar Gouveia, “a democracia não é o regime do ‘vale tudo’” , de modo que, havendo “alarme na opinião pública”, deve ser desencadeado o controle judicial da constitucionalidade dos partidos . O presente pedido fundamenta-se, portanto, na letra da CRP e na interpretação de renomados constitucionalistas, que convergem na necessidade de ação preventiva quando partidos adotam posturas antissociais, racistas ou autoritárias.
Exposição Factual
1. Tentativas de revisão constitucional extremadas: O CHEGA tem proposto abertamente emendas constitucionais radicais. Um exemplo foi a intenção de reduzir drasticamente o número de deputados na Assembleia da República (de 230 para 150) através de revisão constitucional. Mais gravemente, André Ventura chegou a defender a extinção do Ministério da Educação, o fim da escola pública e do SNS no programa do partido, alterações incompatíveis com as tarefas fundamentais do Estado (art. 9.º c), d)). Tais propostas denotam a disposição de alterar de forma profunda o conteúdo social da Constituição de 1976.
2. Declarações pós-eleitorais de André Ventura (18/05/2025): No dia 18 de maio de 2025, durante celebrações pós-eleitorais, o líder do CHEGA, André Ventura, proferiu discurso de vitória carregado de ameaças ao regime democrático. Entre outras afirmações, disse: “Eles ainda não viram nada.” Uma frase de Ventura absolutamente perturbante, onde referia-se à acusação de Pedro Nuno Santos, minutos antes, de que a extrema-direita está mais agressiva, violenta e mentirosa. Ventura não ridicularizou, não negou, não desviou. Em resposta aos cânticos antifascistas “não passarão”, enquanto gritavam: “já passamos!”, Ventura gritava: “Superámos o partido de Mário Soares, matámos o partido de Álvaro Cunhal, varremos o BE do mapa”. Essas frases evidenciam a retórica agressiva do partido: apresenta-se como algo novo e radical, que eliminará partidos históricos e valores consolidados.
3. Normalização de discurso de ódio e racismo: O CHEGA tem disseminado abertamente discurso xenófobo e racista. Em campanha, Ventura e outros militantes publicaram vídeos ofensivos contra imigrantes e romenos, por exemplo. Mais recentemente, lideranças ciganas apresentaram queixa de “discurso de ódio” contra o próprio Ventura. Jornalistas relataram declarações do CHEGA que associavam pessoas de minorias a crimes ou apelavam à expulsão de cidadãos estrangeiros dos serviços públicos (SNS, Segurança Social). Como noticiou o Expresso, dirigentes de associações ciganas reconheceram que o ódio que motivava protestos contra o CHEGA advém do “cansaço gerado pelo ‘ódio’ disseminado por André Ventura”. Em suma, o partido normaliza um clima de estigmatização de grupos étnicos, alimentando preconceitos contrários ao art. 13.º CRP.
4. Misoginia e homofobia na Assembleia: Deputadas denunciaram episódios de insultos sexistas e homofóbicos praticados por deputados do CHEGA nas dependências da Assembleia da República. Segundo reportagem, caminhar pelos corredores pode resultar em ouvir gritos de “vaca” e “mugidos” dirigidos a mulheres – especialmente se pertencentes à comunidade LGBTI – ou o ritual ofensivo de desejar “boa noite” a uma deputada negra ao meio-dia, como piada racista. O CHEGA reagiu acusando as vítimas de fabricarem conflitos, mas os relatos eram corroborados por várias parlamentares (Isabel Moreira, Romualda Fernandes, Inês Sousa Real). Estes comportamentos reiteram como membros do CHEGA desrespeitam a dignidade e a igualdade previstas na Constituição.
5. Ameaças ao Estado Social (SNS, Educação, Segurança Social): O CHEGA tem explicitado seu projeto de desmantelamento do Estado Social. Ventura defende, por exemplo, restrições no acesso de estrangeiros ao Serviço Nacional de Saúde (SNS). Declarou publicamente que “tem de haver limitação no acesso dos estrangeiros ao SNS” e que as medidas propostas para corrigir o ‘turismo de saúde’ não podem ser “meramente cosméticas”. Em suma, pretende condicionar direitos sociais universais a critérios étnico-nacionais. Em síntese, as diretrizes do partido visam substituir o modelo solidário constitucional por um mercado de acesso condicionado, em violação da tarefa constitucional de promover “bem-estar e qualidade de vida” e de tutelar todos cidadãos.
6. Desrespeito aos valores do 25 de Abril e à CRP de 1976: O CHEGA e seu líder demonstram reiterado descaso pelo legado do 25 de Abril e pela Constituição estabelecida naquele ano. Ventura, por exemplo, ataca símbolos da revolução (ao insinuar que Marina Celeste – ícone do 25 de Abril – morreu «abusada» no SNS, distorcendo fatos históricos) e trata a Constituição como obstáculo ideológico. Abandonam o plenário na celebração da data e consistentemente se mostram contra. Essa postura subverte o respeito constitucional mínimo exigido de qualquer partido democrático.
7. Apelos autoritários contra a imprensa e adversários: O discurso do CHEGA inclui frequentes ataques à liberdade de imprensa e ao pluralismo político. Em campanha recente, Ventura chegou a qualificar jornalistas como “inimigos do povo”, imitando retórica clássica de regimes autoritários. Em vídeo de campanha, manipulou imagens e acusou sem provas órgãos de comunicação, estimulando a desconfiança e hostilidade contra a imprensa livre. Também propôs medidas autoritárias: por exemplo, já afirmou que partidos (ou políticos) que apoiem vagas do SNS para estrangeiros devem ser penalizados, sugerindo “encerrar” ou excluir esses partidos da vida política. Essa linguagem violenta e inquisitorial contra cidadãos e adversários políticos viola o Estatuto dos Deputados e os cânones do debate democrático.
O padrão comportamental descrito significa risco grave para a democracia portuguesa. Em democracias consolidadas, a emergência de partidos xenófobos e autoritários costuma preceder processos de radicalização política e polarização social. Como advertido no exposto, a Constituição portuguesa não admite partidos racistas – postura alinhada com as recomendações de especialistas. A normalização de ódio e discriminação pode encontrar respaldo político e social: exemplos históricos demonstram que estímulos à violência ou à apologia de violência (apesar de proibidos) geram consequências trágicas. O caso da Aurora Dourada na Grécia serve de alerta: inicialmente um partido legal com discurso ultranacionalista, acabou envolvido em assassinatos e foi banido após crimes concretos. Vital Moreira lembra que “racismo e xenofobia são violência e apologia da violência… se calhar é de não esperar por homicídios” para entender o perigo.
Em Portugal, permitir passivamente que discursos violentos e ações discriminatórias prosperem “por dentro” do sistema representa aceitar o Paradoxo da Democracia (ser o único regime que admite ser destruído internamente). Se a sociedade civil se cansar da inércia institucional, pode haver protestos e contraprovas perigosas, conforme já ocorreram com comunidades ciganas.
O risco é ainda potencializado pela retórica agressiva contra órgãos de Estado independentes. Em termos práticos, suas propostas de limitar a atuação judicial ou intervir na comunicação social quebram a separação de poderes e a liberdade de expressão, pilares constitucionais defendidos no art. 2.º CRP.
Finalmente, a normalização da ignorância histórica sobre o 25 de Abril e a Constituição de 1976 – através de narrativas distorcidas – fere diretamente o compromisso dos dirigentes políticos com a própria República instituída. Esse quadro de envenenamento do debate público, se não contido, tende a provocar polarização agressiva e a exclamar as minorias. O que se vê, portanto, é um partido que aspira a moldar Portugal segundo critérios nacionalistas autoritários, opondo-se à pluralidade e aos direitos sociais consagrados. Essa agenda oferece “horrorizar a democracia” de dentro, em perfeita consonância com o «Paradoxo da Democracia» descrito por Bacelar: só medidas preventivas firmes podem impedir que se concretize. O episódio do NPD alemão (2017) ilustra a delicadeza da questão: o tribunal constatou ser o NPD extremista, mas justificou o não-banimento por seu reduzido eleitorado. Em Portugal, todavia, o CHEGA ultrapassa faixas eleitorais mínimas e está institucionalizado há tempo suficiente para que se apliquem instrumentos de controle contínuo, não meras esperas estatísticas.
Em vista do exposto, é urgente que o Ministério Público e o Tribunal Constitucional atuem em defesa da Constituição e da democracia portuguesa. Não se trata de censurar opiniões divergentes, mas de examinar se o CHEGA ultrapassa os limites constitucionais permitidos
A permanência do partido CHEGA na Assembleia da República e a ampla difusão do seu discurso no espaço público e mediático têm constituído, de forma progressiva, um vetor de desestabilização do regime democrático, de degradação das instituições e de legitimação de comportamentos objetivamente perigosos para o Estado de Direito. Importa, desde logo, assinalar que diversos membros do partido — incluindo deputados com mandatos em vigor — foram já formalmente associados, nos últimos anos, a uma larga variedade de ilícitos criminais. A partir de levantamento exaustivo e publicamente documentado por órgãos de comunicação de referência, verifica-se que, entre os tipos de crimes imputados, constam: Tráfico de droga; Violência doméstica; Abuso sexual de menores; Branqueamento de capitais; Burla e falsificação de documentos; Ofensa à integridade física; Ameaça e coação agravada; Apologia da violência; Posse ilegal de arma proibida; Injúria e difamação; Condução sob o efeito de álcool; Discriminação racial, religiosa e de género; Desobediência à autoridade. Este conjunto de condutas revela um padrão reiterado de desrespeito pela legalidade democrática e pelos valores essenciais da convivência cívica.
Para além destes indícios criminais, verifica-se também um comportamento institucional sistemático e deliberado de degradação do debate parlamentar e de incitamento à violência e ao ódio. O próprio espaço da Assembleia da República tem sido instrumentalizado por membros do Chega como palco de intimidação, insulto e ameaça a outros deputados, incluindo mulheres, pessoas com deficiência, representantes de minorias étnicas e dissidentes políticos. Recorde-se, a título particularmente grave, por exemplo, que o deputado Pedro Arruda, em sessão parlamentar, afirmou explicitamente que “não se responsabilizava pelo controlo da sua bancada” face à presença e intervenção de um ex-deputado dissidente do próprio partido, numa evidente insinuação de possível violência física dentro da Assembleia. Esta prática é sintomática de uma estratégia contínua de confrontação física e psicológica, atentatória da dignidade parlamentar.
Este padrão de violência simbólica e verbal extravasa, porém, o espaço institucional. Nas redes sociais e na comunicação digital, tem-se verificado uma escalada alarmante de discurso de ódio e violência dirigida, em especial, contra mulheres e minorias. São numerosos os relatos — documentados em capturas e denúncias públicas — de mensagens onde se apelida mulheres de “- feministas”, se deseja que sejam “violadas” ou se profere ameaças como “enfiar os cravos pelo cu acima”. A retórica partidária — frequentemente misógina, xenófoba e homofóbica — tem tido um efeito direto de catalisação deste tipo de ataques, criando um clima de permissividade e legitimação da violência social.
A agressão física a um autarca do Partido Socialista por um simpatizante do Chega no dia das eleições é, infelizmente, apenas um exemplo recente do potencial real e material dessa incitação. Casos como a tentativa de impedir a atuação do artista Nininho Vaz Maia em contexto municipal demonstram, por outro lado, uma deriva persecutória e censória que ameaça a liberdade cultural e artística e que remete para práticas próprias de regimes autoritários.
Adicionalmente, o Chega propôs leis que colidem com princípios fundamentais, como a expulsão de cidadãos estrangeiros condenados por certos crimes, o que levanta sérias dúvidas quanto à compatibilidade com os direitos humanos e à igualdade perante a lei.
Ressaltamos ainda que o líder do partido, André Ventura, tem utilizado sistematicamente a comunicação social como plataforma de hostilidade institucional, desinformação e ataque aos princípios democráticos fundamentais em discursos apontam não apenas para uma retórica de confronto, mas para uma estratégia de ocupação e substituição simbólica da representação democrática tradicional por um projeto de cariz iliberal.
Este contexto político e social configura uma situação de risco concreto para a coesão social, para a estabilidade democrática e para a preservação dos direitos fundamentais. A continuidade da atuação do partido Chega, com as atuais características, promove objetivamente a normalização da violência, a radicalização do discurso político, o descrédito das instituições e o colapso da confiança cívica. Como tal, invocam-se os fundamentos constitucionais da defesa do regime democrático contra organizações que, pela sua prática reiterada e programática, colocam em causa a dignidade da pessoa humana, a igualdade, a liberdade e os valores consagrados nos artigos 1.º, 9.º, 13.º e 46.º da Constituição da República Portuguesa.
Neste sentido, e face aos factos amplamente documentados, entende-se ser imperativo que o Tribunal Constitucional, ouvido o Ministério Público, analise com urgência a compatibilidade da existência legal do partido CHEGA com os princípios estruturantes da Constituição da República. A inação institucional face à crescente radicalização e ao discurso de ódio institucionalizado constitui, em si mesma, uma ameaça à democracia.
Pedidos
Face ao exposto, requer-se o seguinte:
1. Ajuizamento de fiscalização sucessiva: Que se determine a instauração imediata pelo Ministério Público do procedimento de controle sucessivo da constitucionalidade do Partido CHEGA, nos termos do art. 277.º da CRP, visando avaliar continuamente se a prática do partido se mantém conforme a Constituição.
2. Ação de inconstitucionalidade: Que, caso o Ministério Público conclua pela existência de indícios sérios de violação dos valores constitucionais pelo CHEGA (art. 1.º, 9.º, 13.º, e 46.º n.º 4), seja intentada ação judicial junto do Tribunal Constitucional, nos termos do art. 284.º CRP, para declarar a inconstitucionalidade e consequente extinção do Partido CHEGA .
3. Comissão parlamentar de avaliação: Que a Assembleia da República crie, de urgência, uma comissão especial de inquérito ou avaliação para estudar o fenômeno do CHEGA e de demais movimentos de extrema-direita em ascensão, propondo medidas legislativas (p.ex., alterações na Lei dos Partidos) que reforcem a conformidade constitucional dos partidos políticos e os mecanismos de supervisão democrática.
4. Revisão dos critérios legais de partidos: Que se promova a revisão da Lei Orgânica dos Partidos Políticos (Lei n.º 24/2007) para endurecer os requisitos de legalização partidária, incluindo cláusulas que exijam compromisso explícito com os direitos fundamentais constitucionais, transparência financeira e democracia interna dos partidos, prevenindo a entrada de organizações com fins antissociais ou autoritários.
5. Divulgação ampla e providências complementares: Que seja dada ampla publicidade a esta petição e anexos, para conhecimento público, e submetida às comissões parlamentares pertinentes e ao Conselho de Estado, assegurando-se o debate institucional necessário.
Estas medidas visam concretizar os mecanismos legais de defesa da democracia e da Constituição, conforme art. 277.º (fiscalização sucessiva) e art. 284.º (exceção de inconstitucionalidade), bem como fortalecer o regime jurídico-político face a desafios emergentes. Solicitamos que este pedido seja analisado com a máxima prioridade, atendendo ao caráter de urgência que os valores constitucionais e a ordem democrática exigem.
Constituição da República Portuguesa (CRP): A própria CRP veda partidos e associações racistas ou paramilitares. Em particular, o art. 46.º, n.º 4, define que “não são consentidas associações armadas nem de tipo militar, nem organizações racistas ou que perfilhem a ideologia fascista.”. Se o Chega ou seus órgãos programáticos fossem qualificados como “organização racista” ou pró-fascista, estariam proibidos de se constituir e sujeitos à extinção compulsória. Ademais, a CRP garante nos arts. 51.º e 52.º direitos fundamentais relacionados:
• Art. 51, n.º 1: “A liberdade de associação compreende o direito de constituir ou participar em […] partidos políticos e de, através deles, concorrer democraticamente para a formação da vontade popular” . Isto reconhece o direito do Chega existir como partido e disputar eleições, desde que respeite a Constituição.
• Art. 52, n.º 1: “Todos os cidadãos têm o direito de apresentar […] petições […] para defesa dos seus direitos, da Constituição, das leis ou do interesse geral” . Garante aos cidadãos (e associações) o direito de peticionar ao Parlamento ou Tribunais para questionar, por exemplo, a constitucionalidade de um partido.
• Art. 45.º (Reunião/Manifestação): “Os cidadãos têm o direito de se reunir pacificamente […] sem necessidade de qualquer autorização” , e art. 46.º garante a “liberdade de associação”. Esses dispositivos respaldam também atos públicos (petições, manifestações) contra o partido.
Lei dos Partidos Políticos (Lei Orgânica n.º 2/2003, atualizada) define condições de registo, funcionamento e extinção de partidos. O artigo 18.º estabelece que o Tribunal Constitucional deve extinguir um partido a requerimento do Ministério Público se este for “qualificado como partido armado ou de tipo paramilitar, ou como organização racista ou que perfilhe a ideologia fascista”. Logo, se o Chega se enquadrasse legalmente como “racista” ou “fascista”, sua existência seria ilícita segundo a lei. Outros artigos relevantes incluem: liberdade de filiação (art. 19.º, impedindo expulsões por motivos de raça ou género) e dever de organização interna democrática (art. 22.º, proibindo normas estatutárias contrárias a direitos constitucionais).
Em suma, o quadro normativo aplicável contém (i) na CRP restrições explícitas a partidos racistas/fascistas e garantias de direitos políticos (liberdade associativa, direito de petição); (ii) na Lei dos Partidos punições sérias (extinção judicial) se partidos forem considerados racistas ou paramilitares. Estes dispositivos deverão ser citados e invocados na petição: por exemplo, art. 46.º(4) CRP e art. 18.º(1)(a) da Lei de Partidos proíbem a existência de organizações com ideologia racista/fascista, dando base legal ao pedido de fiscalização.
Em suma, ao Ministério Público e ao Tribunal Constitucional compete tomar as medidas previstas na Constituição para garantir que nenhuma organização política por inconstitucional que seja permaneça ativa. Pelos fundamentos expostos e provas reunidas, requer-se a imediata atuação dos órgãos competentes para salvaguardar os princípios fundamentais da República Portuguesa, nos termos legais.
Pede deferimento,
(Cidadãos subscritores)