Pela adoção da “Alternativa Zero” da linha de alta velocidade na sua configuração atual
Para: Ex.mo Senhor Presidente da Assembleia da República
A Linha de Alta Velocidade (LAV) Porto-Lisboa, nos moldes em que se encontra apresentada nos estudos prévios e no Estudo de Impacte Ambiental, este em curso até ao dia 16 de junho de 2023, não se revela uma infraestrutura fundamental nem imprescindível para Portugal.
Estudos relativos à alta velocidade ferroviária realizados em Portugal nos finais da primeira década deste século preconizavam a construção de um traçado em bitola europeia, passível de ligação direta à rede ferroviária internacional e previam, no percurso entre Porto e Lisboa, a construção de novas estações, que significariam o nascimento de novas centralidades com potencial de desenvolvimento económico, social, demográfico e até cultural.
Agora, em 2023, no Estudo de Impacte Ambiental que se encontra em consulta pública, o percurso da Linha de Alta Velocidade apresentado é construído todo ele em bitola ibérica, dificultando a futura integração na rede europeia de transporte ferroviário. E, mesmo que venha a ser possível adaptar a linha para bitola europeia, tal implicará, no futuro, novos e avultados gastos.
O investimento previsto na construção da LAV é de 4.900 Milhões de euros. O facto de se encontrar previsto que tal linha seja construída em bitola ibérica é altamente restritivo do financiamento da obra por parte da União Europeia, desde logo através do PRR, o que acarretará para o país, leia-se para os portugueses, mais um desmesurado esforço de pagamento de gastos públicos, a somar a tantos outros que já suportam.
No âmbito do projeto “Linha Ferroviária de Alta Velocidade entre Porto e Lisboa Fase 1: Troço Porto/Soure, Lote A – Troço Aveiro (Oiã) / Porto (Campanhã)”, encontra-se prevista a construção de uma ligação da Linha de Alta Velocidade à Linha do Norte que, considerando os diversos traçados em projeto, atravessará, entre outras, a freguesia de Canelas e Fermelã, no concelho de Estarreja.
Essa ligação apresenta diversas debilidades a nível estrutural, nomeadamente:
• Acrescenta tráfego ferroviário à saturada Linha do Norte, na ordem, segundo o Projeto, de mais 52 comboios diários. Atendendo a que, no percurso Porto / Lisboa, é a única ligação a capitais de distrito que não comporta duplicação da atual linha, verifica-se clara contradição com uma das premissas deste projeto que é, alegadamente, a “libertação de capacidade da Linha do Norte para o tráfego de passageiros regional e suburbano e o de mercadorias.”
• Os comboios que, saindo do traçado principal, se desloquem a Aveiro, verão o seu percurso acrescido em aproximadamente 30 km. Somados com os ramais de Coimbra e Leiria, resultará numa distância substancialmente acrescida e num tempo de viagem em tudo semelhante ao do atual Alfa Pendular.
• A entrega a privados da gestão do Serviço de Longo Curso “Alfa Pendular”, assumido pelo Estado como Serviço de Interesse Económico Geral, e Intercidades, contratualizado como Obrigações de Serviço Público (OSP) conduzirá à redução duma parte significativa da receita da CP e a um inevitável incremento nos preços a pagar pelos passageiros.
• Nunca no passado foi equacionada a ligação da LAV, através da linha do Norte, à Cidade de Aveiro, mesmo após estudos de outros cenários de exploração.
• O projeto do ramal de Canelas assentou na premissa irreal que a zona de Canelas é onde “as vias são mais próximas”;
• Os impactes ao nível socioeconómico, como sendo a afetação de áreas urbanas, demolição de habitações, efeito barreira, etc. serão gigantescos, num concelho já extremamente fustigado por infraestruturas (autoestradas A1, A29, EN 109, Linha do Norte, Rede Elétrica Nacional, Gasoduto);
• Impactes ecológicos irreversíveis, dos quais se destacam o atravessamento da Zona Especial de Conservação da Ria de Aveiro (Directiva habitats) e da Zona de Proteção Especial da Ria de Aveiro (Directiva Aves), a afetação da Reserva Ecológica Nacional e da Reserva Agrícola Nacional;
• Irão ser destruídos elementos patrimoniais de considerável relevo e interesse histórico e cultural, como moinhos e azenhas seculares, capelas, quintas, etc.
Por todas as razões supra aduzidas, o interesse deste projeto para o desenvolvimento económico do país não se consegue vislumbrar, apresentando-se o mesmo como desajustado da realidade que é a rede europeia de alta velocidade, não passível de obter significativos ganhos de tempo nas viagens entre Porto e Lisboa, quando “visitem” as capitais de distrito Aveiro, Coimbra e Leiria, altamente lesivo de interesses económicos, sociais, culturais e ambientais dos territórios e populações que atravessa, mormente – e no caso da ligação da LAV à Linha do Norte em Aveiro – às freguesias de Canelas e Fermelã, Salreu, Beduido e Avanca, do concelho de Estarreja.
A opção pela Alternativa Zero, ou seja, pela inexistência de projeto, é a que, face ao EIA apresentado, se afigura mais sensata e técnica, económica e socialmente ajustada.
Assim, os cidadãos abaixo assinados, apesar de se encontrarem inteiramente a favor do progresso e da existência de uma Linha de Alta Velocidade em Portugal, repudiam veementemente as intenções do governo de construir esta mesma linha nos moldes apresentados e exigem que seja abandonado o projeto atual, procurando soluções mais coerentes com a realidade do território português
Primeiro Signatário:
Tiago Miguel Oliveira Pinto Silva Gassman
Rua Padre Joaquim Domingues Silva n.º 16, 3865-031 Canelas-ETR
Titular do cartão de cidadão n.º 10125529