PELA REVISÃO DAS SUBVENÇÕES MENSAIS VITALÍCIAS
Ex.mo Senhor Presidente da República
Ex.mo Senhor Presidente da Assembleia da República
Ex.mo Senhor Primeiro Ministro,
Esta Petição data de 2016, mas, para a subscrever, o(a) interessado(a) deve fornecer o número do Cartão de Cidadão(ã)
Título: PELA REVISÃO COM CRITÉRIO DAS SUBVENÇÕES MENSAIS VITALÍCIAS (SMV)
1. Conceito, Enquadramento e Abolição
1.1 O direito às SMV
A Lei nº 4/85, de 9 de Abril atribuiu, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1985, o direito
ao recebimento de um subsídio (subvenção) pago(a) mensalmente ao respectivo
beneficiário, até ao fim da sua vida (vitalício), com base no facto de este ter exercido,
após o 25 de Abril de 1974 e pelo menos durante 8 anos, um cargo político de entre os
seguintes: membro do Governo, deputado à Assembleia da República, ministro da
República para as Regiões Autónomas, membro do Conselho de Estado, juiz do Tribunal
Constitucional que não seja magistrado de carreira, governador de Macau e secretário
adjunto de Macau.
1.2 Situações em que é suspenso o pagamento da SMV, total ou parcialmente
Tendo por referência o artigo 26º da Lei nº 4/85, entretanto já revogado pelo artigo 6º
da Lei nº 52-A/2005, de 10 de Outubro, o pagamento da SMV é suspenso durante todo
o período que durar o exercício de quaisquer funções políticas ou públicas remuneradas
(n.º 1 do artigo 9.º da Lei n.º 52-A/2005, de 10 de Outubro, com a redação dada pela Lei
n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro), nomeadamente as seguintes: Presidente da
República, Presidente da AR, membro do Governo, Deputado, Juiz do Tribunal
Constitucional, Provedor de Justiça, ministro da República para as Regiões Autónomas,
membro dos Governos Regionais, deputado às Assembleias Legislativas das regiões
autónomas, deputado ao Parlamento Europeu, embaixador, eleito local em regime de
tempo inteiro, gestor público ou dirigente de instituto público autónomo, o exercício de
funções a qualquer título em serviços da administração central, regional e autárquica,
empresas públicas, entidades públicas empresariais, entidades que integrem o setor
empresarial municipal ou regional e demais pessoas coletivas públicas.
É esta a situação designada na lista publicada como “redução total” e abrange 112 dos
332 beneficiários das SMV constantes da lista publicada.
Quanto às situações de “redução parcial”, a que estão sujeitas as SMV de 18
beneficiários, elas resultam da redução do valor da SMV, sempre que o exercício de
atividade privada, incluindo de natureza liberal, por parte de beneficiário de uma SMV,
seja remunerado com valor médio mensal igual ou superior a três vezes o indexante dos
apoios sociais (€ 1 257,66), para o que os beneficiários comunicam à CGA, até ao dia 31
de Janeiro de cada ano, o montante dos rendimentos provenientes de atividade privada
auferidos no ano civil anterior (n.ºs 7 e 8 do artigo 9.º da Lei n.º 52-A/2005, de 10 de
Outubro, com a redação da Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro).
1.3 Situações em que o beneficiário é obrigado a optar (ou não) pela SMV
Desde 1 de Janeiro de 2011, rege a nova redacção dada pela Lei nº 55-A/2010, de 31 de
Dezembro ao artigo 9º da Lei nº 52-A/2005, segundo a qual os beneficiários de
subvenções mensais vitalícias, ex-Presidentes da República inclusive, que exerçam
quaisquer funções políticas ou públicas remuneradas, nomeadamente em quaisquer
serviços da administração central, regional e autárquica, empresas públicas, entidades
públicas empresariais, entidades que integrem o sector empresarial municipal ou regional
e demais pessoas colectivas públicas, devem optar ou pela suspensão do pagamento da
subvenção vitalícia ou pela suspensão da remuneração correspondente à função política
ou pública desempenhada.
1.4 As primeiras restrições às SMV, dez anos depois: idade mínima e tempo mínimo
A partir de 27 de Outubro de 1995, o direito à SMV passou a depender também, mas só
para futuro, do requisito da idade mínima de 55 anos de idade.
Foi mantida, por isso, a possibilidade de a subvenção ser atribuída a quem, à data de 26
de Outubro de 1995, ainda não tivesse completado os 55 anos de idade, bastando que,
até essa data, tivesse já completado 8 anos de exercício do cargo político com direito a
SVM.
Diga-se, a talhe de foice, que uma certa generosidade para com os potenciais
beneficiários fez com que a Lei nº 4/85 permitisse que, no apuramento do número de
anos indispensáveis para aceder à SMV, não fossem descontados os dias de suspensão
de mandato de deputado inferiores, em média, a 5 dias por cada sessão legislativa, e que
inclusive pudesse prescindir-se em média de dois dias por cada sessão legislativa,
quando, para completar o requisito de tempo de 8 ou de 12 anos, fosse esse o período
em falta.
Entretanto, socorrendo-se de uma possibilidade prevista na Lei nº 26/95, 14 foram os
Deputados que, não tendo completado os 8 anos até 26 de Outubro de 1995, vieram a
completá-los até 31 de Outubro de 2005, assim tendo ficado investidos no direito de
requererem a qualquer momento a SMV. São eles: os requerentes Duarte Rogério Matos
Ventura Pacheco (PSD), nesta data com redução total, de António Fernando Marques
Ribeiro Reis (PS), de Maria Amélia Carmo Mota Santos (PCP), nesta data com redução
parcial, de Isabel Maria Almeida Castro (PEV), de José Miguel Nunes Anacoreta Correia
(CDS), nesta data com redução total, de Fernando Manuel Santos Gomes (PS), nesta data
com redução total, de Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes (PSD), nesta data com
suspensão a pedido do próprio, de Maria Luísa Raimundo Mesquita (PCP), de Fernando
Santos Pereira (PSD), nesta data com redução total, de Melchior Ribeiro Pereira Moreira
(PSD), nesta data com redução total, de Rui António Ferreira Cunha (PS), de Maria Celeste
Lopes Silva Correia (PS), de Alberto Bernardes Costa (PS) e de Antero Gaspar Paiva Vieira
(PS).
1.5 Aos 60 anos de idade, o valor da SMV é duplicado oficiosamente
O montante da SMV (que, antes dos 60 anos, corresponde a 4%, por ano de exercício, do
vencimento base correspondente à data da cessação de funções do cargo em cujo
desempenho o seu titular mais tempo tiver permanecido) passa a ser de 8%, por ano de
exercício, do referido vencimento, quando o beneficiário da subvenção perfaça 60 anos
de idade.
Embora, a partir de 27 de Outubro de 1995, só os beneficiários com mais de 55 anos de
idade pudessem obter a SMV, outros houve que puderam requerer e obter a SMV, com
idade inferior a 55 anos de idade, desde que já tivessem completado 8 anos de exercício
do cargo antes dessa data, em consonância, de resto, com aquilo que o nº 3 do artigo 3º
da Lei nº 26/95 não se esqueceu de prever.
A análise da lista publicada, depois de cotejadas as datas de atribuição das SVM com as
datas de nascimento constantes da biografia de deputados, verifica-se que 14, todos do
PSD, e uma deputada, à data, ainda no PCP, requereram e obtiveram a SMV, com base
no requisito de tempo mínimo de 8 anos, antes de perfazerem os 41 anos de idade: Jaime
Gomes Milhomens(33), Luís Carlos David Nobre (34), José Alberto Puig Santos Costa (34),
Mário Jorge Belo Maciel (34), Nuno Francisco Fernandes Delerue Alvim Matos (35),
Fernando José Antunes Gomes Pereira (36), Eduardo Alfredo Carvalho Pereira Silva (36),
Carlos Manuel Oliveira Silva (37), João José Pedreira Matos (37), Adérito Manuel Soares
Campos (38), António Augusto Lacerda Queirós (38), Jorge Paulo Seabra Roque Cunha
(39), Zita Maria Seabra Roseiro (39), Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco (40) e João
Álvaro Poças Santos (40).
Destas 14 SMV, nesta data, seis estão activas, estando as restantes oito com “redução
total”, ou seja, suspensas, nestas últimas se incluindo a SMV atribuída a um deputado
ainda em funções.
Em média, a atribuição destas 14 SMV data de há cerca de 20 anos (uma está a ser paga
a Zita Seabra, há 28 anos), havendo dois beneficiários alcançado os 60 anos de idade,
pelo que o valor da respectiva SMV já terá sido oficiosamente duplicado.
Por conseguinte, podendo o ponto de partida ser diferente, por causa do requisito da
idade mínima, certo é que, aos 60 anos, a SMV duplica o seu valor, mantendo-se
entretanto o limite de 80% do vencimento base correspondente à data da cessação de
funções do cargo em cujo desempenho o seu titular mais tempo tiver permanecido.
1.6 Se o beneficiário falecer, a SMV deixa de ser recebida?
Sim e não: apenas uma pequena parte (25%) deixa de ser recebida.
O remanescente (75%) pode, na verdade, passar a ser auferido por alguns herdeiros do
beneficiário falecido, precedendo a apresentação de requerimento.
Em caso de morte do beneficiário de SMV, o direito à subvenção transmite-se ao cônjuge
sobrevivo, que tem direito a metade, 37,5%, e o remanescente caberá aos descendentes
menores e aos ascendentes a cargo do beneficiário, que o dividirão entre si, em partes
iguais, extinguindo-se, sem direito a acrescer, a parte correspondente dos que mudarem
de estado civil, atingirem a maioridade, se tornarem incapazes ou falecerem. A lei não
prevê qualquer prazo para a apresentação do requerimento, presumindo-se que tal
poderá acontecer “a qualquer momento”, como previu para os requerentes directos
beneficiários.
Ou seja: a SMV é um direito que pode ser reclamado, em qualquer momento, pelos
herdeiros cônjuge, descendentes menores ou ascendentes a cargo, na parte que não
exceda 75% do seu valor.
1.7 Uma condição de recursos declarada inconstitucional
Apesar de o pagamento de uma SMV, já atribuída, ter estado suspenso, devido a opção
do seu titular ou devido a redução total ou parcial, parece que nada obsta a que, após a
morte do beneficiário, venham a ser deferidos 75% do seu valor a alguns herdeiros, pelo
menos enquanto estes não mudarem de estado civil, não atingirem a maioridade, se
tornarem incapazes, ou faleçam.
O que não deixa de ser um desvirtuamento escusado da natureza da SMV, uma vez que
a mesma, segundo entendimento firmado pelo Tribunal Constitucional (TC), no seu
Acórdão 3/2016, configura uma recompensa de natureza pessoal, a favor do e apenas
do titular do cargo político exercido, e não uma pensão que dê origem a uma pensão de
sobrevivência, como acontece com as pensões baseadas em carreira contributiva de
algumas dezenas de anos.
Aliás, supostamente por isso, o legislador entendeu restringir o recebimento das SMV,
em 2014 e em 2015, estabelecendo um limite, com base no rendimento médio anual de
todo o agregado familiar, “puxando” para esta área a situação económica do agregado,
que se julgava poder abranger alguns dos presuntivos herdeiros do beneficiário da SMV.
A declaração de inconstitucionalidade proferida pelo TC em Janeiro de 2016 reverteu a
situação, fazendo pagar os retroactivos das SMV, na parte em que foram alvo de
desconto ou suspensão.
Mas não pode acusar-se o legislador de, ao impor a condição de recursos do agregado
familiar, ter sido inconsequente com a solução da transmissibilidade da SVM a favor de
alguns herdeiros.
A solução de 1985 é, na verdade, excessiva e até errada, mas a imposição da condição
de recursos do agregado limitou-se retirar consequências da transmissibilidade da SMV
a alguns herdeiros (arbitrária e fora da lógica de outras generosidades é a relativa ao
direito a acrescer, vedado pela Lei nº 4/85 quanto aos descendentes e ascendentes,
direito este há muito reconhecido no direito civil, quando haja acervos hereditários
disponíveis, dentro da mesma classe de sucessíveis).
Como diz o Juiz Lino Rodrigues Ribeiro, no seu voto de vencido …a lei não pretende que
o reconhecimento do direito à subvenção fique dependente da prova da carência de
recursos, mas apenas que a redução temporária do valor da subvenção tenha em conta
os rendimentos do agregado familiar. … tal critério não parece desadequado porque a
natureza não contributiva da subvenção, a sua autonomia em relação às pensões de
aposentação e de reforma, com as quais é cumulável, e a transmissão “mortis causa” do
direito revelam que o beneficiário não é apenas o ex-titular de cargo político, mas
também pode ser o seu agregado familiar. Daí que não há uma situação de confiança a
tutelar, muito menos uma frustração da confiança desproporcional ao interesse público
a prosseguir no ano económico de 2015 com a sujeição das subvenções à condição de
recursos.
1.8 Uma alternativa em dinheiro (subsídio de reintegração) à SMV
Em alternativa ao recebimento da SMV, a lei concedia (antes de 1 de Novembro de 2005)
aos titulares de cargos políticos que não tivessem completado os 8 anos (até 26.10.1995)
ou os 12 anos (até 31.10.2005), o direito a um subsídio de reintegração em dinheiro,
correspondente a tantos meses quantos os semestres durante os quais estiveram no
exercício do cargo, tendo por base o vencimento mensal do cargo à data da cessação de
funções.
Subsídio esse cujos 50% deveriam ser restituídos, se ocorresse a assunção de algum
cargo político, antes de decorrido o dobro do período de tempo contabilizado para o
pagamento do subsídio de reintegração.
Não é possível quantificar quantos titulares de cargos políticos receberam esta
compensação em dinheiro, mas é de supor que nenhum titular de cargo político deixou
de se lembrar de requerer, à data da cessação de funções, ou a SMV (se a ela tivesse
direito) ou o Subsídio de Reintegração (caso não preenchesse os requisitos de tempo).
1.9 A abolição da SMV e do Subsídio de Reintegração, vinte anos depois
O artigo 6º da Lei nº 52-A/2005 revogou os artigos 24º a 28º, 30º, 31º e 33º da Lei nº 4/85
e interrompeu, mas só para futuro, a aquisição do direito à SMV ou do subsídio de
reintegração até aí consagrados na lei.
Como certamente assim o desejavam os promotores da legislação então produzida pela
maioria absoluta saída das eleições de 20 de Fevereiro de 2005, as SMV (mas já não os
subsídios de reintegração) iriam sobreviver, em benefício de quem tivesse completado,
até 26 de Outubro de 1995, 8 anos de carreira no cargo político ou, até 31 de Outubro de
2005, 12 anos, com a particularidade de o respectivo montante duplicar a partir da data
em que o beneficiário completasse a idade de 60 anos.
Entretanto, note-se, desde já, que alguns dos então abolicionistas das SMV já sabiam que
tinham direito a uma SMV e que podiam requerê-la “a qualquer momento”, apesar da
abolição aprovada, com a expectativa, inclusive, de verem o seu valor duplicado, no
dealbar dos 60 anos de idade.
É conveniente dizer que as SMV continuam a poder ser requeridas e atribuídas, apesar
da lei que as extinguiu, registando-se, ao analisar a lista publicada, que foram atribuídas,
entre 2006 e 2016, um total de 88 SMV, 52 das quais com redução total ou parcial.
2. A Natureza das SMV e a revisão que, de novo, se impõe
Nada melhor do que recorrer à doutrina exposta pelo Tribunal Constitucional para
perspectivar adequadamente a verdadeira natureza das SMV criadas em 1985.
Este exercício torna-se indispensável, porque importa saber se, sim ou não, é lícito ao
legislador alterar de novo a situação. E parece que sim, é possível.
É mesmo recomendável que se defronte, de uma vez, o problema das SMV e que se
retirem todas as consequências do facto de as SMV serem, primeiro que tudo, uma
recompensa individual, atribuída a titulares de cargos políticos, à custa de dinheiro
retirado, em última instância, dos impostos, senão até, retirado, em primeira instância,
das contribuições aportadas à CGA pelos subscritores (não há informações sobre esta
matéria que deixou inclusive de figurar em dotação específica do Orçamento do Estado).
Numa altura em que se discutem 10 euros de aumentos em 2017 para todas as pensões
(PCP) ou para pensões abaixo de 628,83€ (1,5 x IAS), algumas até de raiz contributiva, é
lícito suscitar a razoabilidade de a alguns destinatários se concederem generosidades
avulsas e a outros se exigir comedimento no acesso à utilização de recursos.
O Acórdão do Tribunal Constitucional nº 3/2016, publicado no DR, 1ª Série, de 2 de
Fevereiro, que declarou a inconstitucionalidade da condição de recursos imposta às SMV
na Lei do OE2015, com 8 votos a favor e 5 contra, aponta as seguintes características às
SMV:
a. … (as SMV) não pressupõem qualquer prévia contribuição do beneficiário para o
sistema de segurança social, tendo, pois, natureza não contributiva: esta especial
(e única) natureza das subvenções mensais vitalícias diferencia-as de qualquer
outra prestação não contributiva então existente ou posteriormente criada. Não
pretendem recompensar empenho, nem compensar sacrifícios. Pretendem apenas
garantir a sobrevivência;
b. a Lei n.º 4/85 teve seis versões distintas entre 1985 e 2005, tendo sido
posteriormente alterada, também por sucessivas leis do Orçamento do Estado,
entre as quais se destaca a lei do OE2014. A maior parte dessas alterações inserem-se numa trajetória crescentemente restritiva, impondo-se, a cada versão do texto
legal, exigências adicionais para o reconhecimento do direito à subvenção e
condições mais rigorosas para o seu recebimento efetivo;
c. … as sucessivas alterações legislativas deveriam ter alertado os afetados para a
precariedade desse regime, já que as subvenções vitalícias, não sendo um elemento
constitucionalmente imposto ao estatuto dos titulares de cargos políticos, nem
consubstanciando uma concretização necessária de um direito fundamental, não
são imunes à possibilidade de uma reconfiguração legislativa com alcance redutor
do círculo dos beneficiários e dos montantes das prestações;
d. … a subvenção vitalícia dos ex-titulares de cargos políticos não constitui uma
dimensão concreta, nem do direito constitucional ao salário, nem do direito à
segurança social. Por outras palavras: não é, na sua específica caracterização, nem
remuneração, nem pensão, não gozando, por isso, da proteção constitucional
conferida a estes dois tipos de rendimento. Representa antes um puro benefício,
que, por razões específicas, válidas num certo contexto histórico, o legislador
entendeu atribuir a uma categoria de sujeitos e cuja resistência às alterações
legislativas é seguramente mais ténue;
e. … o legislador não fica, no presente, rigidamente “preso”, em quaisquer
circunstâncias, à opção que tomou no passado, podendo legitimamente prosseguir
e reforçar a revisão restritiva do regime destas subvenções, afetando
inovatoriamente a posição de quantos eram beneficiários.
Donde, é lícito, expectável e recomendável que, de novo, se aborde a questão das SMV
e, desta feita, com critérios adequadamente testados, sem remédios de ocasião para
questões pontuais, até para dignificação da classe política e da própria democracia.
3. Erros e incorrecções do regime actual das SMV
O que releva do regime jurídico da Lei nº 4/85 e das suas sucessivas alterações, para além
do amadorismo que sobressai das normas de autoatribuição de benefícios, por parte da
classe política dos Deputados, beneficiária mais próxima e numerosa deste benefício
(SMV e Subsídio de Reintegração), é o seguinte:
a. Benefícios atribuídos sem previsão de receitas
Não se vislumbra qualquer preocupação acerca de que receitas iriam suportar o
pagamento das SMV, tanto mais que nem sequer foi delimitado, com aproximação, o
universo dos potenciais beneficiários.
Já no que toca aos subsídios de reintegração, pode presumir-se que seria o próprio
serviço onde foi exercido o cargo ou função a suportar o pagamento do subsídio por
ocasião da cessação de funções, mas é uma falha.
b. Custos e potenciais beneficiários das SMV não foram estimados
Mesmo que se tivesse previsto de onde sairia o dinheiro para pagar pelo menos as SMV
(que, hoje, parecem ser encargos da Caixa-Geral de Aposentações, cujas necessidades de
financiamento, não por acaso, têm vindo a ser crescentes), mesmo assim, é lamentável
que não se tenha promovido a realização de um estudo ou feito uma simples projecção
de quais e quantos seriam os beneficiários das SMV, que era a primeira das condições
para que o legislador tivesse adoptado a solução mais justa e equilibrada, relativamente
à questão que se propôs regulamentar.
c. Requerimentos aceites “a qualquer momento” indiciam descontrolo
Ao deixar nas mãos dos próprios beneficiários a possibilidade de requererem as SMV “a
qualquer momento” (como se acha previsto no ainda vigente artigo 3º da Lei nº 29/95,
de 18 de Agosto), o legislador já então, como hoje, mostra ter-se desinteressado dos
custos futuros com esta recompensa, alguns dos quais ainda imprevisíveis, em especial,
os decorrentes da eventual obrigação de pagamento de SMV ainda não requeridas.
d. Os custos das SMV vão oscilar ao sabor das circunstâncias
Restringindo a previsão meramente sumária a titulares de cargos políticos que foram ou
ainda são deputados e pelos dados consultados em www.parlamento.pt, admitindo que
completaram o tempo todo das legislaturas que lhes estão assinaladas, ainda conservam
o direito de requerer a SMV “a qualquer momento” mais de 30 deputados e exdeputados.
Após a consulta de dados que lhes respeitam, com referência a Outubro de 2016, ainda
poderão vir a requerer a SMV “a qualquer momento” os seguintes 34 titulares, 31 dos
quais não eleitos na XIII legislatura e 3 ainda deputados na actual legislatura, por
preencherem, supostamente e pelas contas feitas, os requisitos de tempo mínimo
estabelecidos na Lei nº 4/85 (com a redacção da Lei nº 26/95):
Nome Partido Legislaturas Nome Partido Legislaturas
António B. A. da Gama Lobo Xavier CDS-PP III, IV, VI e VII Jaime José Matos da Gama PS I,I a VII e IX a XI
António Filipe Gaião Rodrigues PCP V a XIII Jaime Carlos Marta Soares PSD II a VI, VIII e X
António Joaquim Correia Vairinhos PSD V, VI e VII João Granja Rodrigues da Fonseca PSD V, VI e VII
António José Martins Seguro PS IV, VI, VII, IX a XII João António Gomes Proença PS V e VI
Armando de C. Guerreiro da Cunha PSD V e VI Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho PS V a X
Carlos Manuel Duarte de Oliveira PSD V,VI e VII José de Almeida Cesário PSD III a XIII
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho PSD I e III a VII José Júlio Carvalho Ribeiro PSD I,III,VI e VII
Cipriano Rodrigues Martins PSD II a VI José M. de Albuquerque Almeida Leitão PS I,I,III e VI a IX
Dinah Serrao Alhandra PSD I,II e IV a VI José Manuel Borregana Meireles PSD V e VI
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela PS V, VI, VIII, IX e XIII José Narciso Rodrigues de Miranda PS III a VI
Joaquim Manuel Cabrita Neto PS I,II e IV a VII Júlio da Piedade Nunes Henriques PS V, VI e VII
José Manuel Durão Barroso PSD IV a IX Luís António Martins PS I a VI
Guilherme V. P. de Oliveira Martins PS II,III, VI a X Mário Manuel Videira Lopes PS VI e VII
Helder Oliveira dos Santos Filipe PS V e VI Miguel B. M. da Costa de Macedo e Silva PSD V a VIII e X a XII
Maria Helena Falcão R. Ferreira Mourão PSD V e VI Miguel Urbano Tavares Rodrigues PCP V e VI
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia PEV VI a XIII Maria Teresa Doria Santa Clara Gomes PS/UEDS II, V e VI
Hilário Torres Azevedo Marques PSD V e VI Alberto de Sousa Martins PS V a VII e IX a XIII
Legenda:
Período da Legislatura Legislatura Período da Legislatura Legislatura
03-06-1976 a 02-01-1980 I (Constituinte) 27-10-1995 a 24-10-1999 VII
03-01-1980 a 12-11-1980 I 25-10-1999 a 04-04-2002 VIII
13-11-1980 a 30-05-1983 II 05-04-2002 a 09-03-2005 IX
31-05-1983 a 03-11-1985 III 10-03-2005 a 14-10-1999 X
04-11-1985 a 12-08-1987 IV 15-10-2009 a 19-06-2011 XI
13-08-1987 a 03-11-1991 V 20-06-2011 a 22-10-2015 XII
04-11-1991 a 26-10-1995 VI 23-10-2015 a … XIII
4. Propostas de correcção do actual regime jurídico das SMV
4.1 Respeitar o círculo já vedado pela declaração de inconstitucionalidade
Na base do Acórdão proferido pelo TC, em 13 de Janeiro de 2016 (decorria já a campanha
para as eleições presidenciais, em que Mª de Belém Roseira, deputada e beneficiária de
uma SMV, fora co-peticionária da declaração de inconstitucionalidade, intervindo
também como candidata), estava o pedido de um grupo de 30 deputados e ex-deputados,
19 dos quais já beneficiários de SMV, sendo 21 do PS (Alberto Costa, Alberto Martins, Ana
Paula Vitorino, André Figueiredo, António Braga, Celeste Correia, Fernando Serrasqueiro,
Idália Serrão, João Barroso Soares, Jorge Lacão, José Junqueiro, José Lello, José
Magalhães, Laurentino Dias, Maria de Belém Roseira, Miguel Coelho, Paulo Campos,
Renato Sampaio, Rosa Maria Albernaz, Sérgio Sousa Pinto e Vitalino Canas) e 9 do PSD
(Arménio Santos, Carlos Costa Neves, Correia de Jesus, Couto dos Santos, Francisco
Gomes, Guilherme Silva, Hugo Velosa, Mota Amaral e Joaquim Ponte). Bastavam 23 (um
décimo dos deputados, exigido na alínea f) do nº 2 do artigo 281º da CRP), subscreveram
o pedido mais 7.
O legislador que, já em 2005, não atacara o problema adequadamente, garantindo a
sobrevivência de um benefício que ele próprio considerou desnecessário para futuro,
apesar de o considerar justificado quer para aqueles que o tivessem já requerido, quer
para aqueloutros que poderiam ainda requerê-lo, “a qualquer momento”, bem podia terse abstido de lançar mão da condição de recursos como forma de “moralizar” a situação
e bem dispensava ter de passar por uma declaração de inconstitucionalidade, com o TC a
mandar pagar os retroactivos das SMV que tinham sido suspensas, com base em excesso
dos recursos económicos, adicionados, do beneficiário da SMV e do seu agregado
familiar, acima dos 2 000 euros mensais.
Ao pretender restringir inadequadamente o recebimento das SMV, como se de pensões
sociais não contributivas se tratasse (e fê-lo nas Leis do OE 2014 e do OE 2015), o
legislador deu o flanco para que fosse suscitada a fiscalização sucessiva da norma do
artigo 80º da Lei nº 82-B/2014, de 31 de Dezembro.
Em consequência, se se quiser alterar o regime das SMV, está vedado ao legislador, com
base na declaração de inconstitucionalidade de 13 de Janeiro de 2016, exigir aos
beneficiários das SMV atribuídas que provem não precisar das mesmas por suficiência de
recursos económicos ou que, ao contrário, provem precisar, por insuficiência de recursos
económicos.
4.2 Introduzir critérios novos, tais como a caducidade do direito
Com base no entendimento firmado pelo Acórdão do TC nº 3/2016, de 13 de Janeiro,
segundo o qual o legislador não fica, no presente, rigidamente “preso”, em quaisquer
circunstâncias, à opção que tomou no passado, podendo legitimamente prosseguir e
reforçar a revisão restritiva do regime destas subvenções, afetando inovatoriamente a
posição de quantos eram beneficiários, importa, pois, dar um passo correcto e adequado
para que este tema seja devidamente abordado.
Tratando-se de uma prestação pecuniária que não se confunde com uma pensão social e,
por isso, insusceptível de submissão à condição de recursos, sob pena de
inconstitucionalidade e de desvirtuamento da sua finalidade, mas sim, concorde-se ou
não, … de (i) uma recompensa pelo empenhamento do beneficiário na coisa pública, (ii)
para compensá-lo pelo sacrifício decorrente da previsível perda futura de oportunidades
profissionais e (iii) para protegê-lo de incertezas futuras suscetíveis de comprometer as
suas condições de vida, então, as SMV deveriam obedecer a uma lógica de previsibilidade
de custos, em paralelo com o carácter temporário da recompensa, e com a respectiva
transmissibilidade por morte vedada a quem quer que seja.
Para a previsibilidade de custos contribuiria, e muito, além da lista já publicada, a
obrigação, sob pena de caducidade do direito, de apresentação de requerimento, por
parte de todos os potenciais beneficiários, com a data limite de 31 de Dezembro de 2016.
Isto teria a vantagem de os por enquanto ainda não requerentes se apresentarem ao
recebimento da SMV, por com ela concordarem, e, no caso de não concordarem, também
lhes iria vedar o acesso à SMV, após um período de transição, sem necessidade de
renúncia.
Adicionalmente, ficaria também prevista a possibilidade de algum dos actuais
beneficiários assumir, não a suspensão sine die do recebimento da SMV, que apenas
configura um “não requerimento” conservatório do direito, mas sim uma renúncia
expressa e definitiva ao recebimento da SMV.
4.3 Introduzir critérios novos, tais como um período máximo
Tratando-se de uma recompensa, não parece de bom aviso prolongá-la de tal modo no
tempo que a mesma se descaracterize e perca a utilidade para que foi criada, não
parecendo adequado configurá-la como se se tratasse de uma pensão de velhice ou até
de invalidez.
Diga-se, a este propósito, que o próprio legislador ajudou a criar equívocos, tratando as
SMV como se fossem pensões sociais, quando, por exemplo, no artigo 77º da Lei nº 83-
C/2013, que aprovou o OE para 2014, não se coibiu de mencionar as subvenções de
sobrevivência, em pagamento e a atribuir, quando pela primeira vez submeteu as SMV à
condição de recursos, nos termos do regime de acesso a prestações sociais não
contributivas.
Tendo o início do recebimento das SMV sido fixado como regra nos 55 anos de idade,
uma idade limite razoável, a coincidir com os 85 ou até mesmo com os 90 anos de idade,
permitiria, à primeira vista, salvaguardar as expectativas dos beneficiários mais velhos.
No entanto, analisando a lista publicada apenas quanto aos deputados e ex-deputados
com SMV, constata-se que houve 101 beneficiários da SMV que alcançaram o
recebimento das SMV antes dos 55 anos.
Sendo assim, a solução mais equitativa e adequada parece ser a de fixar um período
máximo para a manutenção do direito, de contagem ininterrupta, nele ficando incluídos
os períodos de suspensão, até porque, nesses casos, o direito não se extinguiu, apenas se
encontrou suspenso.
Esse período máximo, salvo falecimento que interrompa o recebimento da SMV, seria de
35 anos, contados desde a data da atribuição, cessando o recebimento da SMV no mês
seguinte àquele em que se completem 35 anos sobre a data da atribuição. Quem, por
exemplo, tivesse iniciado o recebimento da SMV com 35 anos cessaria o recebimento da
mesma aos 70 anos.
Restringindo a análise da lista publicada apenas aos que são ou foram deputados, com
SMV em pagamento, e articulando a data da atribuição da SMV com a respectiva data de
nascimento, constata-se que, nas SMV pagas há mais tempo, há oito SMV que já
excederam os 25 anos e 49 que são pagas há mais de 20 anos, pelo que o período máximo
de 35 anos se torna razoável e coerente com a natureza da SMV:
Beneficiário Data de Idade Recebe há
da SMV Atribuição (à data) (nº de anos)
1. Georgete Oliveira Ferreira ---------------------01.12.1985----------60 ---------------30
2. Luís Filipe Nascimento Madeira --------------03.02.1987----------46 ---------------30
3. Zita Maria Seabra Roseiro----------------------12.07.1988----------39 ---------------28
4. António Duarte Arnaut -------------------------24.02.1988----------52 ---------------28
5. António Manuel Maldonado Gonelha ------24.10.1988----------53 ---------------28
6. Álvaro Pereira Silva Leal Monjardino--------16.03.1989----------58 ---------------28
7. Francisco Manuel Lopes V. Oliveira Dias ---29.03.1989----------59 ---------------27
8. Amândio Anes Azevedo ------------------------19.01.1990----------61 ---------------27
9. António Augusto Lacerda Queirós -----------17.12.1991----------38 ---------------25
10. Carlos Alfredo Brito------------------------------27.12.1991----------58 ---------------25
11. Mário Oliveira Mendes Santos----------------30.06.1992----------48 ---------------24
12. João Cerveira Corregedor Fonseca-----------19-06-1992 ---------53 ---------------24
13. Edmundo Pedro ----------------------------------05-06-1992 ---------73 ---------------24
14. Adelaide Maria Medina Teles -----------------19-05-1993 ---------57 ---------------23
15. Domingos Abrantes Ferreira ------------------07-01-1994 ---------57 ---------------23
16. M.ª Margarida R. C. Salema O. Martins-----28-11-1994 ---------40 ---------------22
17. José Albino Silva Peneda -----------------------12-05-1995 ---------44 ---------------22
18. António Fernando Couto Santos -------------31-03-1995 ---------45 ---------------22
19. Jerónimo Carvalho Sousa ----------------------09-05-1994 ---------47 ---------------22
20. José Ângelo Ferreira Correia ------------------03-01-1995 ---------49 ---------------22
21. Jaime Gomes Milhomens ----------------------23-02-1996 ---------33 ---------------21
22. José Alberto Puig Santos Costa ---------------10-01-1996 ---------34 ---------------21
23. Mário Jorge Belo Maciel------------------------28-11-1995 ---------34 ---------------21
24. Nuno Francisco F. Delerue Alvim Matos----06-02-1996 ---------35 ---------------21
25. Eduardo Alfredo Carvalho Pereira Silva-----05-12-1995 ---------36 ---------------21
26. Carlos Manuel Oliveira Silva -------------------05-12-1995 ---------37 ---------------21
27. João José Pedreira Matos----------------------06-12-1995 ---------37 ---------------21
28. Adérito Manuel Soares Campos--------------23-02-1996 ---------38 ---------------21
29. Nuno Manuel Franco Ribeiro Silva -----------22-04-1996 ---------41 ---------------21
30. António Costa Albuquerque Sousa Lara ----28-11-1995 ---------43 ---------------21
31. António José Caeiro Motta Veiga ------------28-11-1995 ---------44 ---------------21
32. A. Domingues Azevedo (falecido)--------------05-02-1996 ---------45 ---------------21
33. João Domingos F. Abreu Salgado-------------27-11-1995 ---------45 ---------------21
34. Luís Manuel Costa Geraldes -------------------19-12-1995 ---------45 ---------------21
35. José Manuel Oliveira Gameiro Santos-------02-02-1996 ---------45 ---------------21
36. Rui Carlos Alvarez Carp -------------------------06-12-1995 ---------45 ---------------21
37. Francisco João Bernardino Silva --------------01-02-1996 ---------45 ---------------21
38. Cecília Pita Catarino -----------------------------27-11-1995 ---------46 ---------------21
39. Vasco Francisco Aguiar Miguel----------------29-02-1996 ---------46 ---------------21
40. Manuel Joaquim Baptista Cardoso-----------07-12-1995 ---------47 ---------------21
41. Filipe Manuel Silva Abreu ----------------------14-12-1995 ---------48 ---------------21
42. Joaquim Maria Fernandes Marques---------27-11-1995 ---------49 ---------------21
43. Fernando Reis Condesso -----------------------27-02-1996 ---------49 ---------------21
44. Marília D. C. Pires Morgado Raimundo -----19-12-1995 ---------50 ---------------21
45. José Manuel Maia Nunes Almeida -----------22-11-1995 ---------50 ---------------21
46. Aristides Alves Nascimento Teixeira---------30-11-1995 ---------50 ---------------21
47. Alberto Cerqueira Oliveira ---------------------27-11-1995 ---------51 ---------------21
48. Manuel Costa Andrade -------------------------27-11-1995 ---------51 ---------------21
49. António Magalhães Silva -----------------------20-09-1995 ---------51 ---------------21
50. Joaquim Vilela Araújo ---------------------------17-01-1996 ---------52 ---------------21
51. Rui Alberto Limpos Salvada--------------------24-11-1995 ---------52 ---------------21
52. Virgílio Oliveira Carneiro -----------------------27-11-1995 ---------55 ---------------21
53. Manuel Albino Casimiro Almeida ------------01-02-1996 ---------56 ---------------21
54. José Luís Nogueira Brito ------------------------26-09-1995 ---------57 ---------------21
55. Guido Orlando Freitas Rodrigues-------------22-12-1995 ---------60 ---------------21
56. Maria Conceição Ulrich Castro Pereira------27-11-1995 ---------61 ---------------21
57. Adriano José Alves Moreira--------------------11-12-1995 ---------73 ---------------21
Fixar um período máximo de 35 anos para que a SMV possa ser paga a quem a ela pôde
aceder não frustra quaisquer expectativas resultantes da natureza da SMV, se for
entendida, na senda do que o TC também entende, como uma recompensa de auxílio e
de recuperação na fase mais avançada da vida, após a cessação de funções no cargo
político.
4.4 Introduzir critérios novos, tais como a intransmissibilidade, por se tratar de uma
recompensa de carácter individual
A transmissibilidade das SMV é um dos pontos menos conhecidos, mas mais discutíveis,
do regime previsto para as SMV.
Sendo uma recompensa de carácter individual, a SMV não pode nem deve ser transmitida
a qualquer herdeiro do beneficiário, desde logo, por não assistirem aos herdeiros razões
idênticas ou semelhantes àquelas que estiveram na base da atribuição da SMV e, depois,
porque não colhem aqui argumentos fundados numa hipotética analogia com pensões
de sobrevivência, porque já sabemos que nunca as SMV foram ou serão pensões de
velhice.
4.5 Eliminar a duplicação oficiosa das subvenções em coincidência com os 60 anos
Uma recompensa não deveria, sob pena de ficar desvirtuada na sua finalidade, começar
por abranger apenas metade do seu valor, para, à medida a que idade avança, duplicar o
valor inicial.
A solução idealizada pela Lei nº 4/85 permite que uma SMV fundada numa remuneração
base do beneficiário, por exemplo, de 2 000 euros, possa atingir um máximo de 80%
(1 600 euros), mas os caminhos do seu cálculo só têm coerência para premiar a idade, em
vez de acolher como melhor critério o tempo de exercício do cargo.
- se o beneficiário completou 8 anos de carreira, por hipótese, aos 40 anos, a SMV
será de 640 euros (4% ao ano x 8 anos x 2 000 euros); quando o beneficiário completar
60 anos, a SMV passará a ser de 1 280 euros;
- se o beneficiário completou 12 anos de carreira, por hipótese, aos 40 anos, a SMV
será de 960 euros (4% ao ano x 12 anos x 2 000 euros); quando o beneficiário
completar 60 anos, a SMV passará a ser de 1 600 euros, por não poder exceder 80%
No domínio das conjecturas, que vale o que vale, deve ter-se constatado em 1985 que,
depois de cumpridas três legislaturas, precedidas da legislatura da Assembleia
Constituinte, no espaço de tempo equivalente a pouco mais de 9 anos, era baixa uma
SMV de 32% para uma carreira política de 8 anos (4% x 8 anos), relativamente a potenciais
beneficiários na casa dos 50 anos.
Talvez por isso, pretendeu-se deixar desde logo assinalado que, cessando as suas funções
mais cedo, esses potenciais beneficiários não deixariam de alcançar um valor semelhante
ao que poderiam vir a alcançar nas legislaturas seguintes, o que, a ser verdade, acabou
por corresponder até a uma SMV mais elevada, com 8 anos de carreira e 60 anos de idade
(8% x 8 =64%), do que aquela que alcançariam, com 12 anos de carreira e idade inferior
a 60 anos (4% x 12 = 48%).
4.6 Manter a obrigação de opção prevista na nova redacção do artigo 9º da Lei nº 52-
A/2005, dada pela Lei nº 55-A/2010
A acumulabilidade das SMV com quaisquer pensões já era, por si mesma, uma má
solução, porque as SMV eram tratadas como se fossem rendimentos de pensões.
A acumulabilidade deu lugar ao dever de opção, e bem. Deve permanecer.
Subsistem as situações de redução total e de redução parcial, que devem permanecer.
4.7 Declarar a caducidade das SMV atribuídas, relativamente a beneficiários que tenham
sido alvo de sentença condenatória com trânsito em julgado
Por razões óbvias.
5. A finalizar
5.1 Assim se promove a descapitalização da Caixa Geral de Aposentações (CGA)
Além de as SMV serem vistas como benefícios auto-atribuídos sem carreira contributiva
que as suporte, são também uma forma, inaceitável, pelo menos aos olhos de quem
efectuou descontos no seu salário ao longo da carreira contributiva, de descapitalização
crescente da entidade que paga pensões de aposentação.
Quando se fala em descapitalização da CGA, facilmente se esquece que muitas razões
houve para tal acontecer, desde a ausência de contribuições do Estado como entidade
patronal (mesmo sabendo-se que o Estado assumia e assume o pagamento das pensões,
o dinheiro, afinal, continua em falta nos cofres da CGA, cobrindo outras necessidades,
restando apenas as entregas obrigatórias dos subscritores, não podendo os impostos
servir para tapar esta falha perante a CGA) até à exaustão de fundos de pensões
integrados na CGA, a que a Assembleia da República, embora com a legitimidade que lhe
dá a competência legislativa, veio acrescentar o pagamento mensal das SMV, algumas
das quais a aproximarem-se dos 30 anos em pagamento.
Continua sem se saber qual a origem das receitas que irão suportar estes encargos com
as SMV, mas a situação actual penaliza os cidadãos em geral e os subscritores da CGA, em
especial, porque as suas pensões provêm de uma carreira contributiva.
5.2 José Sócrates promoveu a abolição das SMV, em Novembro de 2005, de uma forma tal
que a sua, já antes constituída, ainda pôde ser requerida “a qualquer momento”, em
Junho de 2016
Como corolário de toda esta saga, assinala-se que as mais recentes SMV foram atribuídas
em 15 de Janeiro, em 15 de Abril e em 9 de Junho de 2016, por terem sido requeridas,
respectivamente, por Mota Amaral (PSD), por Vitalino Canas (PS) e por José Sócrates (PS),
este último, que liderou o Governo apoiado na maioria parlamentar que aprovou a
abolição das SMV, mas que, certamente não por acaso, preservou as SMV constituídas
antes de 1 de Novembro de 2005.
Lisboa, 10 de Outubro de 2016
Manuel Torres da Silva