Travar o projecto da Praça Rio na sua localização prevista
Para: Exmo. Sr. Presidente da Mesa da Assembleia Municipal de Setúbal; Exma. Sra. Presidente da Câmara Municipal de Setúbal
A Praça do Bocage é o salão nobre da nossa cidade, um espaço de referência e identidade para todos os setubalenses e para aqueles que nos visitam. É um local com história, que foi palco de diversos acontecimentos importantes ao longo dos tempos.
Há dois anos, quando por ordem da autarquia foram demolidas as instalações onde funcionou a Tabacaria Central e o famoso Café Central (que tinha dado lugar ao restaurante Pizza Hut), os setubalenses puderam, por fim, reparar que ali existia um espaço acolhedor e há muito escondido de todos nós: um largo que mantinha uma traça original e era merecedor de uma intervenção digna da sua importância e localização.
No dia 12 de Janeiro de 2021, a autarquia apresentou um projecto para implementar nesse largo, de seu nome Praça Rio, uma obra de arquitectura moderna, que ocupa uma área com cerca de 400 metros quadrados, com pilares metálicos tubulares em tons de antracite e quatro coberturas de madeira revestidas a zinco, inspiradas na ondulação do Sado e dispostas em alturas que variam entre os 4,5 e os 9 metros de altura.
A autarquia alega que a estrutura foi pensada de forma a não interferir com a vertente estética e patrimonial da Praça de Bocage, onde existem vários edifícios de elevado valor. Porém, pelo vídeo de apresentação do projecto percebemos que não é isso que vai acontecer, uma vez que a justificação simplista de que a instalação a várias alturas permite não esconder as fachadas revela uma má leitura da zona envolvente.
De facto, colocar uma estrutura com linhas modernas, e até “ruidosas” em termos formais, frente à Igreja de São Julião, prejudica a relação desta com o largo do Palácio Araújo, edifício seiscentista onde funcionou até há alguns anos o Governo Civil de Setúbal.
Se antes da intervenção de há dois anos esta relação poderia passar despercebida a muitos, pela presença no largo da estrutura em metal e vidro onde funcionava a pizzaria, de então para cá essa relação secular tornou-se evidente, e seria um erro voltar a prejudicá-la com uma solução prêt-a-porter que nada tem de inovador, pois há mais de 20 anos que estruturas similares surgem em estações ferroviárias, rodoviárias, parques infantis ou pavilhões industriais. Houve erros deste género no passado e não faz sentido repeti-los.
Pela sua nobreza, este espaço não merece menos do que uma proposta com identidade única, feita à medida e pensada unicamente para o espaço a que se destina, sem destruir a leitura de uma das praças mais bonitas do país e recordando que os largos ou praças são, por definição, caracterizados pelo vazio e pelo espaço aberto, onde desembocam as ruas estreitas do casco antigo da cidade, evidenciando a malha urbana.
A autarquia refere ainda que o equipamento tem um carácter multifuncional, possibilitando a realização de pequenos apontamentos culturais de música, dança ou teatro, aliado a uma função de ensombramento e protecção durante todo o ano, sendo o investimento na obra superior a 250 mil euros.
A estas declarações há dois tipos de objecções que podemos apresentar. A primeira passa pelo questionamento da real necessidade de um tal investimento em tempos de pandemia, cujos efeitos secundários na economia local já se estão a fazer sentir. Será este um investimento prioritário para os dinheiros públicos?
Caso o entendimento do executivo camarário seja de que “sim, é prioritário criar a Praça Rio apesar do contexto de pandemia”, a primeira questão que se coloca é: porquê ali? E outras interrogações se seguem. Por exemplo, com um nome como Praça Rio, não faria mais sentido estar na frente ribeirinha ou noutro local da cidade onde as linhas arquitectónicas do equipamento não choquem com a zona envolvente?
Como tal, ao abrigo do artigo 52.º (Direito de Petição) do Regimento da Assembleia Municipal de Setúbal, os cidadãos abaixo-assinados instam os órgãos de Poder Local do município a travarem o projeto Praça Rio na sua localização actual, optando por uma das seguintes soluções:
1. Cancelar o projecto e direccionar a verba que seria investida neste projecto para ajudas de emergência à economia e à cultura setubalenses, no âmbito do combate aos efeitos da pandemia de Covid-19;
2. Repensar o projecto e estudar a deslocalização da Praça Rio para um local onde haja uma maior ligação entre o seu nome e a sua localização, e onde a arquitectura do equipamento não choque com a zona envolvente.
