Petição pela proposta de atribuição do Prémio Nobel da Paz a Pierre de Coubertin e ao Comité Olímpico Internacional
Para: Assembleia da República
Exma. Sr.ª Presidente da Assembleia da República
Exmos. Senhores Deputados
Há quase três mil anos, quando a civilização humana ainda se encontrava na sua aurora, despertou nos campos de Olímpia, na Grécia, uma nova Idade durante a qual, geração após geração, os helenos celebraram a sua cultura, religião, valores e modo de vida.
A aura dessa manifestação de identidade nacional através do desporto, estendida por mais de mil anos, não tardou a ganhar contornos lendários, sobretudo pela sua capacidade de gerar paz.
Alguns meses antes do início dos Jogos, partiam de Olímpia mensageiros, carregando uma mensagem sagrada, Ekecheiria, a Trégua Sagrada, ordenando aos beligerantes a interrupção dos combates durante as competições, de forma a permitir que atletas, espectadores e demais viajantes pudessem viajar em segurança e participar nas celebrações Olímpicas.
Independentemente daquele que possa ser o entendimento quanto à capacidade e efectividade desta mensagem na real interrupção dos conflitos entre as belicosas cidades-estado gregas, certo é que esta trégua, este movimento de pacificação, perdurou na memória humana muito para além do crepúsculo da civilização clássica e, mesmo após a extinção dos antigos Jogos Olímpicos.
Decorridos mais de quinze séculos, esses ecos do longínquo conheceram um novo amanhecer pela mão de Pierre de Coubertin, renovador dos Jogos Olímpicos e pai do Olimpismo moderno.
Coubertin nasceu no seio de uma família aristocrática, com claras expectativas que, honrando o seu estatuto, viesse a ocupar um lugar distinto na hierarquia militar.
De facto, tudo se perspetivava fácil na vida deste jovem francês. Abastado, conhecedor, bem-parecido, socialmente considerado, poderia ter feito vida gozando os vastos rendimentos familiares, ocupando o lugar que lhe estava predestinado nos salões e clubes da chique Paris ou saboreando os doces prazeres de uma vida de cavalheiro.
Pierre, todavia, nunca sossegou à sombra do título hereditário nem se rendeu à eminência de uma carreira como líder guerreiro. O seu caminho, o rumo que escolheu para si próprio era o rumo do entendimento e da amizade. O renascer do Olimpismo e a proclamação de uma doutrina de paz, capaz de unir os jovens de todas as nações do mundo numa nova geração mas pacífica e fraterna.
Esta utopia de paz conduziu o francês por trilhos tortuosos, não raras vezes ingratos, menosprezados e infrutíferos. Todavia, e apesar das constantes adversidades, nunca desistiu, entregando-se com fervor a esta ideal de concórdia universal, ao qual dedicou toda a sua vida.
Para nós, que à confortável distância do século XXI vislumbramos a notável obra de Coubertin, é difícil imaginar o quanto de si despendeu pela causa da paz, recluso de horas e dias intermináveis, no pequeno apartamento do n.º 20 da Rue Oudinot (Paris), remetendo incessantes missivas e apelos, tudo pago do seu próprio bolso. Uma devoção à causa capaz de suportar um imenso drama e sofrimento pessoal e familiar. A história de um ser humano que hipotecou o seu conforto e riqueza pela expectativa de um mundo melhor. Tudo isto não nos pode causar senão uma grande admiração e respeito.
Pierre faleceu em 1937 mas os seus sonhos e esperanças, tantas vezes ignorados e secundarizados, perduraram pela mão da instituição que ergueu com o esforço dedicação: O Comité Olímpico Internacional.
Muitos poderão alegar que a acção do Comité Olímpico Internacional foi incapaz de evitar o apocalipse das guerras mundiais porém, a verdade, é que muito poucas instituições no mundo se poderão orgulhar de tanto terem contribuído para a paz e para um melhor entendimento entre os homens: a celebração dos Jogos Olímpicos constitui uma manifestação ímpar de cordialidade universal, a única ocasião em que, durante quinze dias, a humanidade se reúne em paz e igualdade.
Porém, e apesar da inigualável mensagem de concórdia que constituem os Jogos Olímpicos, a actuação do Movimento Olímpico não se circunscreve à celebração deste evento mediático. Diariamente, existe um trabalho tenaz e constante, persistente e incansável que vai muito para além das efemérides desportivas.
O Olimpismo moderno, tal como concebido pelo seu pai fundador, é um meio de aprendizagem para a paz, para a fraternidade, para a cidadania, para a humanização dos povos.
O Olimpismo é um modelo educativo e filosófico que nasce do desporto mas que se propaga naturalmente a todas as vertentes do desenvolvimento humano. Cultivar o Olimpismo é celebrar a humanidade e celebrar a humanidade é garantir a proeminência da paz.
Após a 2.ª Guerra Mundial, a estafeta do facho Olímpico instituiu-se como uma poderosa mensagem de paz, união e partilha entre os seres humanos, devotos a uma chama que, passando de mão em mão, simboliza o que de melhor existe em cada um de nós. Um momento contínuo e harmonioso que homenageia a singularidade do Homem, independentemente da sua idade, credo, sexo ou ideologia política.
A história Olímpica é, de facto, farta em momentos de partilha, de consenso e de uma aliança universal que extravasa diferenças de qualquer ordem. Quem poderá esquecer o momento em que as duas Coreias marcharam sob a mesma bandeira na cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Sydney 2000 ou a mensagem de paz enviada pelos futebolistas iraquianos à sua atormentada nação, durante os Jogos de Atenas em 2004? Será possível ignorar a genuína amizade de Jesse Owens e Luz Long, emulada por inúmeros outros atletas depois deles? Conseguiremos permanecer indiferentes à inspiração proporcionada pelo Olimpismo, na luta de tantas pessoas anónimas contra doenças crónicas e tantas outras tormentas da vida quotidiana?
Através dos tempos, o Comité Olímpico Internacional empenhou-se em garantir uma cada vez maior igualdade entre homens e mulheres, não só no acesso ao desporto, mas também na distribuição dos cargos dirigentes no seio da instituição. Neste campo foram conseguidos progressos assinaláveis, sobretudo na emancipação do sexo feminino em países e sociedades onde, tradicionalmente, o papel da mulher é menosprezado. Em quantos casos o desporto e o Olimpismo não constituíram uma janela de oportunidade para centenas de meninas e jovens?
O empenho do Movimento Olímpico estende-se igualmente ao desporto paralímpico e a tudo aquilo que este representa ao nível da valorização da capacidade humana e da igualdade de oportunidades. O apoio conferido ao Comité Paralímpico Internacional e às suas actividades, bem como a cada vez maior visibilidade dos Jogos Paralímpicos são claros sinais de uma ligação apertada pelos sonhos e esperanças de muitos.
Antes da emergência dos fóruns mundiais sobre o meio ambiente, já o Comité Olímpico Internacional manifestava profunda preocupação com as questões da protecção ambiental e da sustentabilidade, colocando muito do seu foco na promoção de uma gestão fiável e efectiva dos recursos disponíveis. Não se ignore que, as questões ambientais, representam um factor determinante na atribuição da organização dos Jogos Olímpicos e na execução dos mesmos, assim como é elemento indissociável da própria educação Olímpica. De facto, o ambiente é um dos pilares do Movimento Olímpico!
Não ignoramos, porém, as críticas de que recorrentemente o Movimento Olímpico é alvo, sobretudo quanto à comercialização dos símbolos Olímpicos, mas será justo apontar o dedo? A verdade é que o dinheiro dos parceiros Olímpicos tem um fim bem explícito: o investimento na promoção da paz e no desenvolvimento dos povos.
De que outra forma poderiam ter sido criados os centros Olímpicos de desenvolvimento desportivo? De que maneira poderia ser custeada a panóplia de acções em prol da paz, do desporto, da cultura, do ambiente e do desenvolvimento, onde convivem jovens de todas as nacionalidades? Como poderiam ser incrementados os programas de educação Olímpica, atinentes ao desenvolvimento de um ser humano equilibrado, harmonioso e pacífico?
Assinalando o dealbar do novo milénio e um dos sonhos que presidiu ao renascer do Olimpismo o Comité Olímpico Internacional criou, no ano 2000, a Fundação Internacional para a Trégua Olímpica. Mais uma forma de reforçar a preocupação da Família Olímpica com a difusão mundial de uma cultura de paz. Um marco recorrentemente evocado pelas próprias Nações Unidas.
A atribuição do prémio Nobel da paz ao Comité Olímpico Internacional é, não só uma forma de suprir a lacuna e injustiça histórica que constituiu a não atribuição do prémio ao seu pai fundador mas, igualmente, uma distinção merecida a quem, nos últimos 120 anos, mais se tem empenhado na constante promoção da concórdia universal e da educação para uma convivência de paz.
Uma filosofia, um estado de espírito que inspirou figuras marcantes da nossa história contemporânea, como Nelson Mandela ou Philip Noel-Baker e que, diariamente, representa um alento para tantos cidadãos anónimos por esse mundo fora.
Este é o legado de Coubertin, esta é a preocupação diária do Comité Olímpico Internacional e da Família Olímpica, esta é uma lição que vive nas pequenas coisas do nosso dia-a-dia, muitas vezes de uma forma que, simplesmente, não se consegue explicar.
O Olimpismo vive dentro de milhares de corações espalhados por esse mundo fora, milhares de fogos que, despertando de dentro, iluminam a humanidade.
É portanto com profunda fé e emoção que unimos as nossas almas e corações num apelo Universal. Prestes a atingir o ano em que se cumpre o 150.º aniversário do nascimento de Pierre de Coubertin, sentimos dever ser esse o momento da justa retribuição. Um momento que a humanidade se reencontre com a própria história: a atribuição do prémio Nobel da Paz a Pierre de Coubertin e ao Comité Olímpico Internacional!
Acreditamos que o sonho de incontáveis gerações pode tornar-se realidade. Um sonho que é nosso mas que também pode ser vosso. Um sonho universal. Um sonho que significa paz!
Numa época em que o revisionismo histórico coloca em perigo a integralidade do legado de Pierre de Freddy, Barão de Coubertin, solicitamos a V. Exas. a aprovação de um apelo institucional, em nome do Estado Português, dirigido ao Comité Nobel Norueguês, propondo a atribuição do Prémio Nobel da Paz a Pierre de Fredy, Barão de Coubertin e ao Comité Olímpico Internacional.