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MANIFESTO PELO DESENVOLVIMENTO HUMANO E POR UMA IDEIA DE FUTURO NA REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES

Para: Órgãos de soberania portugueses; Órgãos autonómicos da Região Autónoma dos Açores; Instituições públicas e da sociedade civil dos Açores, de Portugal e do Mundo; Cidadãos dos Açores, de Portugal e do Mundo

Nós,
escritores,
intelectuais
e artistas,
cidadãos independentes,
humanistas
e autonomistas dos Açores e do espaço açoriano,
vimos propor
o recentramento da Autonomia da Região
no desenvolvimento humano,
na emancipação da pessoa
e numa ideia de futuro.


À beira de se celebrar o 50.º aniversário do 25 de Abril, entendemos não se dever dar início a uma nova legislatura regional – nem tão-pouco às comemorações do primeiro cinquentenário da Constituição da República de 1976, que consagrou a autonomia dos Açores e da Madeira –, sem com ela se iniciar uma reflexão responsável sobre a realidade em que vivem demasiados Açorianos.

É urgente que os Açores tomem consciência dos seus penosos índices de desenvolvimento humano, aceitando que os números que os compõem contam uma só história: a de uma Região que, mesmo num país ultrapassado por cada vez mais novos membros de uma Europa unida, consegue, ainda assim, destacar-se pela negativa.

É urgente que os Açores sejam capazes de enfrentar, sem sofismas, os desequilíbrios que estes primeiros 48 anos de exercício autonómico não resolveram, promovendo o combate sistemático à pobreza e à desigualdade numa lógica personalista, inclusiva e propiciadora de mobilidade social, da inversão das tendências na educação e do aumento da esperança média de vida.

É urgente que os Açores ponham termo ao nepotismo, ao clientelismo e ao laxismo que vêm corroendo as conquistas da Autonomia, apostando na qualificação da classe política, na capacidade desta para atrair os melhores e no respectivo compromisso de resistir à instrumentalização dos mais vulneráveis – e da própria máquina do Estado – com fins eleitorais.

É urgente que os Açores sejam a Região onde as instituições de solidariedade social não se limitem a gerir a escassez, mas sejam agentes de transformação, e onde as instituições da sociedade civil resistam ao partidarismo.

É urgente que os Açores zelem pela boa mordomia dos recursos externos de que usufruem, esforçando-se na definição de uma economia planeada em torno de prioridades estratégicas – não definida em função dos expedientes financeiros estabelecidos em Lisboa e em Bruxelas –, e na qual a execução dos recursos europeus não constitua a única prioridade da governação ou a totalidade do escrutínio parlamentar.

É urgente que os Açores combatam a ideia de monocultura económica, qualquer que ela seja, e que, sob esse desígnio, comecem por contrariar os piores efeitos da monocultura do turismo – um milagre que não devemos esgotar –, desde logo o açambarcamento do mercado habitacional por fundos de investimento geradores de inflação e gentrificação.

É urgente que os Açores zelem pela liberdade de expressão e pela massa crítica da sua sociedade, promovendo uma comunicação social livre, viável, independente e capaz de voltar a chamar ao debate os intelectuais, os escritores, os artistas, os investigadores e os tantos cidadãos, de todas as áreas de actividade, que, nos alvores da Autonomia, se empenharam em determinar os contornos da nossa identidade comum.

É urgente que os Açores formulem novas políticas nas áreas do ensino e da cultura, com que possam divulgar a leitura, as artes (cénicas, musicais, plásticas, televisivas e outras) e o pensamento abstracto, levando os artistas e os criadores às escolas da Região, de modo a fomentar uma cultura de participação e consumo cultural desde tenra idade.

É urgente que, nos Açores, se pare de diabolizar as vítimas, condenando-as ao estatuto de white trash, e se impeça que a Região, sendo o melhor lugar de Portugal para as classes média e média-alta, continue a ser o pior para os pobres.

É urgente que os Açores saibam fazer-se respeitar pelo país e pelo mundo, defendendo e potenciando os recursos garantidos pela Constituição, protegendo-se da tentação do etnocentrismo, cultivando a curiosidade e a mundividência, orgulhando-se da sua posição geoestratégica e do seu mar infinito e aderindo sem reservas aos esforços do Ocidente no combate à ameaça climática, ao autoritarismo, à exclusão e à injustiça.


Pelo contrário, a Região Autónoma dos Açores persiste em liderar, com regularidade ou em permanência, as taxas anuais de:

– risco de pobreza (em regra, com o dobro da taxa nacional), desigualdade na distribuição dos rendimentos, exclusão social, assistencialismo, dependência do Rendimento Social de Inserção e subsidiodependência em geral;

– analfabetismo, iliteracia, défice de formação escolar básica, absentismo escolar, retenção escolar, abandono escolar precoce (em regra, com mais de quatro vezes a taxa nacional e com a maior taxa da Europa) e insucesso escolar;

– mortalidade infantil, obesidade infantil, obesidade, diabetes, incidência cancerígena, alcoolismo, suicídio jovem, suicídio, produção e consumo de drogas sintéticas;

– violência doméstica, abuso sexual, incesto, gravidez na adolescência, crimes contra as pessoas, ritmo de crescimento da criminalidade violenta e ritmo de crescimento da mendicidade;

O poder eleito passou décadas indiferente à necessidade de formular um discurso sobre este problema e, quando o fez, fê-lo tarde e por mera conveniência eleitoral. Inclusive, alguns desses maus resultados agravaram-se significativamente depois disso. A situação exige a intervenção cívica daqueles que se preocupam.

Vimos, pois, propor um amplo debate – social, político e cultural – sobre o tema e lamentar a condescendência generalizada das elites regionais e nacionais para com os Açores e os Açorianos, incluindo o recurso a eufemismos impróprios de um povo que lutou contra o isolamento, a insularidade, os terramotos, os furacões, o despovoamento e o fatalismo da emigração.

Nos Açores do século XXI, e salvo flutuações estatísticas esporádicas, um em cada quatro jovens entre os 15 e os 34 anos não trabalha nem estuda. A toxicodependência, a corrupção e o crime em geral crescem sem controlo. O encarceramento por pequenos delitos, supremo sinal de desigualdade social, é o mais alto do país. Pelo contrário, o consumo de cultura contemporânea é o mais baixo, tal como o são (noutro âmbito) os índices de actividade física ou (noutro ainda) a taxa de aleitamento materno.

Última classificada na competitividade e na coesão, a Região bate recordes negativos tanto no desenvolvimento económico como no chamado elevador social. O número de sem-abrigos cresceu dramaticamente na última década. Mesmo em 2023, continuaram a ser anunciados novos investimentos em bairros sociais concêntricos e na política de gueto há muito abandonada na generalidade no mundo ocidental.

A taxa de institucionalização da pessoa permanece a mais alta de todo o território português, tal como a do consumo de antidepressivos. Os números da abstenção não têm paralelo em Portugal e a mulher está virtualmente ausente da vida pública. Sete ilhas encontram-se em situação de emergência demográfica. A esperança média de vida chega a situar-se quatro anos abaixo da nacional.


Nós, Açorianos e amigos dos Açores, cidadãos livres e preocupados com a coisa pública e o bem comum, vimos exigir o recentramento da Autonomia da Região na emancipação da pessoa, no desenvolvimento humano e numa ideia de futuro:

– para que os Açores possam recuperar o sentido das proporções e a capacidade de se escrutinarem a si mesmos;

– para que, nos Açores, a pobreza deixe de ser um negócio, com influência tanto na gestão dos recursos existentes como na obtenção de novos recursos;

– para que, perante um cenário de tal dimensão, os políticos não se possam limitar a discutir a redução da idade da reforma, em vez do aumento da esperança média de vida;

– para que, numa Região onde as instituições, as empresas, as associações, os clubes desportivos e o próprio Estado subsistem em larga medida dos diferentes mecanismos de assistência disponíveis, os mais pobres não sejam os únicos anatemizados;

– para que nunca mais, num contexto de tal emergência, a comunicação social nacional possa olhar para umas eleições legislativas açorianas como uma mera primeira ronda (sic) das eleições legislativas nacionais;

– para que a Autonomia dos Açores esteja sempre, e em primeiro lugar, ao serviço das pessoas e da justiça;

e

– para que, naquilo em que tal não seja possível concretizar de imediato, se possa começar a caminhar nesse sentido.


O silêncio é cúmplice. A cidadania nunca é cúmplice. Nem dos poderes, nem das conveniências individuais, nem do statu quo – e muito menos quando este é injusto.


Por ser verdade e para que conste, assinam abaixo (e abrem aos braços à co-assinatura dos demais que se preocupem):

Joel Neto, escritor
José Henrique Ornelas, professor catedrático
João de Melo, escritor
Álamo Oliveira, escritor
Anabela Borba, presidente da Cáritas Diocesana dos Açores
Avelino Meneses, professor catedrático
Carlos Bessa, presidente do Instituto Açoriano de Cultura
Carlos Enes, historiador
Diniz Borges, professor e escritor
Germano de Sousa, médico e professor catedrático
João Pedro Porto, escritor
José Lopes de Araújo, jornalista
Luísa Ribeiro, poeta
Luís Avelar, especialista em aeronáutica civil
Maria João Vargas Moniz, professora universitária
Osvaldo Cabral, jornalista
Pedro Almeida Maia, escritor
Renata Correia Botelho, poeta
Roberto Rodrigues, presidente da Associação Daniel de Sá
Vamberto Freitas, crítico literário
Vasco Pereira da Costa, escritor



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Esta petição foi criada em 10 janeiro 2024
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