Petição contra as restrições e discriminação no acesso à Prestação Social para a Inclusão (PSI)
Para: Sua Excelência O Senhor Presidente da República; Sua Excelência O Senhor Presidente da Assembleia da República; Sua Excelência O Senhor Primeiro Ministro; Sua Excelência O Senhor Provedor de Justiça
Foi recentemente aprovado pelo Governo o enquadramento legislativo que cria a Prestação Social para a Inclusão (PSI). Trata-se de uma mudança de paradigma no que diz respeito à forma como são olhadas, pelo Estado, as questões da inclusão das pessoas com deficiência, assente numa visão de cidadania. Mas justamente porque é de uma visão de cidadania que se trata, não se compreendem as restrições contidas no documento, que excluem, marginalizam e discriminam um número significativo destas pessoas.
Desde logo, preocupa-nos o caso das pessoas com deficiência que, tendo deficiência aos 55 anos, ultrapassaram já a idade legal para a reforma, não podendo por isso mesmo receber esta prestação. São pessoas que, em razão da idade, estão mais vulneráveis e fragilizadas quer do ponto de vista financeiro, quer em termos de inclusão social e exercício da cidadania, carga discriminatória que já suportaram ao longo da sua vida contributiva enquanto pessoas com deficiência, tendo contribuído, com enorme sacrifício, para a promoção de uma vida ativa, e mantendo ainda hoje, não raras vezes, um contributo ativo de cidadania.
Deixar de fora da PSI estes cidadãos é perpetuar a sua permanente sujeição à armadilha da pobreza e da exclusão, sem razão atendível dado que todos eles já suportaram o estigma da deficiência durante toda a sua vida ativa, continuando a suportá-lo, agora agravado pelos fatores discriminatórios associados ao envelhecimento, que os colocam neste particular numa situação de dupla discriminação. Estes cidadãos têm já sofrido os inequívocos custos acrescidos da deficiência ao longo de décadas, continuando ainda hoje a suportar esses custos na promoção de uma cidadania ativa.
Esta situação torna-se ainda mais injusta se considerarmos que, no quadro atual proposto pelo Governo, uma vez adquirido o direito à PSI, esta torna-se vitalícia para os seus beneficiários. A injustiça aumenta ainda se considerarmos que, quer no setor público quer nas empresas privadas, qualquer pessoa pode optar por trabalhar até aos 70 anos, o que faz com que muitas pessoas que tomem esta opção estejam a ser infundadamente discriminadas face a todos os outros que promovem, e praticam, uma vida ativa, no fundo cumprindo aquele que é um dos desígnios da criação da PSI.
Merece-nos igualmente preocupação o caso particular das pessoas com incapacidades entre os 60% e os 79%, em que o direito à prestação fica dependente dos rendimentos auferidos. Os custos com a deficiência também existem nos graus de incapacidade entre os 60% e os 79%, ainda que os referidos custos possam ser menores nestes casos. Manter o direito a uma prestação para a inclusão dependente de rendimentos, como sucede no caso das pessoas com este grau de incapacidade, não só não é consentâneo com o espírito de cidadania promovido pela própria prestação, como cria discriminações infundadas entre as próprias pessoas com deficiência. O mecanismo legislativo poderia, à semelhança do que sucede hoje em dia com os diferentes patamares de incapacidade em sede de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, criar distinções no que toca ao quantitativo da prestação. O que não nos parece admissível é que no caso das pessoas com incapacidades entre os 60% e os 79%, ao contrário dos demais concidadãos com incapacidade de 80% ou mais, o acesso à componente mais básica da prestação fique dependente de rendimentos, na medida em que isso subverte completamente o espírito de cidadania presente nesta primeira componente anunciada para a PSI. Acresce ainda que a promoção de uma vida ativa não se basta apenas com o acesso a um emprego remunerado, sendo fundamental que a própria PSI, nesta sua componente de cidadania e de promoção da vida ativa, encoraje também os cidadãos e as empresas à progressão profissional, pelo que, nos moldes em que foi aprovada pelo Governo, a dependência de um patamar de rendimentos pode contribuir em muito para desencorajar a promoção profissional destas pessoas, uma vez que não só passam a ficar abrangidas por um esquema de tributação apenas em sede de imposto sobre o rendimento, como automaticamente perdem o direito a uma prestação que, por ano, ultrapassa largamente o benefício redistributivo que podem vir a obter no âmbito do sistema fiscal. A manter-se assim, a prestação, que visa objetivos de cidadania e de promoção da vida ativa, converte-se num mecanismo de incentivo à fragilização profissional das próprias pessoas com deficiência.
Por fim, reconhecendo, como faz o Governo, que a deficiência tem custos ao longo de todo o processo de vida, estranha-se a ausência de uma resposta nesta primeira fase para os menores de 18 anos. A verdade é que, na infância como no envelhecimento, existem custos acrescidos e cuidados redobrados que não podem deixar de ser tidos em conta, e que, sendo adequadamente suportados por um mecanismo especificamente orientado para as pessoas com deficiência como é o caso da PSI, permitem reforçar a visão de cidadania e de promoção da vida ativa, particularmente mais sensível nestas franjas de população em que a deficiência representa, do ponto de vista social mas também financeiro, uma fonte de custos adicionais.
Assim, os abaixo assinados, concordando nesta petição com a ACAPO – Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal, requerem aos destinatários desta petição que tomem todas as iniciativas de índole política e legislativa julgadas convenientes para assegurar que a PSI contemple, desde a primeira fase, uma componente de cidadania, e que essa componente abranja todas as pessoas com deficiência, com um grau de incapacidade igual ou superior a 60%, sempre que a deficiência haja sido ou venha a ser adquirida desde o nascimento até aos 55 anos de idade. Especificamente, peticionamos que não seja limitado o direito à PSI àqueles que, com idade superior à idade legal de reforma, já tenham comprovadamente deficiência com grau de incapacidade igual ou superior a 60% desde, pelo menos, os 55 anos de idade. Peticionamos que as pessoas com deficiência, qualquer que seja a sua idade, que tenham presentemente um grau de incapacidade igual ou superior a 60%, não vejam o seu direito à componente básica da PSI ficar dependente de rendimentos. Peticionamos que o direito à PSI possa também abranger os menores de 18 anos.