Em Defesa do Exercício da Profissão de Engenheiro
Para: Exmo. Senhor Presidente da República
Cidadãos contra o regime das qualificações profissionais exigíveis aos técnicos responsáveis no âmbito da elaboração dos projetos, direção de obras, direção de fiscalização de obras e condução da execução dos trabalhos nas diferentes especialidades.
A Assembleia da República aprovou, recentemente, os Decretos n.º 333/XII e n.º 334/XII
(Ex- Propostas de Lei n.º 226 e n.º 227/XII).
Nos termos constitucionais, tais Decretos, antes de serem publicados como Lei, necessitam de promulgação por parte do Senhor Presidente da República.
Conscientes das repercussões nefastas que os mesmos poderão vir a ter na sociedade portuguesa, no mercado nacional e no exercício profissional da maior parte dos técnicos por eles abrangidos, vêm, em último esforço, os cidadãos subscritores da presente Petição, alertar e solicitar ao Senhor Presidente da República que use o direito de veto que possui sobre as Leis e devolva aqueles Decretos à Assembleia da República, ou que, pelo menos, requeira a inconstitucionalidade das normas daqueles diplomas, que tratam das qualificações mínimas adequadas à elaboração de projetos, à direção de obras e à fiscalização de obras, no âmbito dos projetos e obras públicas e particulares.
Incompreensivelmente, porém, deparamo-nos com um diploma que não defende o interesse público e limita-se, na pressa de legislar, a propor uma revisão da legislação cujo resultado se nos afigura negativo porque, para além de padecer de erros técnicos graves associados à definição dos tipos de obras, não considera devidamente a responsabilização dos agentes intervenientes no ato de construir e a diferenciação das intervenções que levem em conta a formação base, experiência profissional e formação contínua.
Estas propostas de revisão operadas pelo Decreto n.º 334/XII (e também pelo Decreto n.º 333/XII – acesso à construção) não refletem as boas práticas do estado da arte e merecem, designadamente, as seguintes críticas globais de fundo:
1. Questiona-se a oportunidade e o propósito desta alteração, uma vez que a revisão da Lei 31/2009 de 3 de julho não contempla o designado Processo de Bolonha, nem o aparecimento da Ordem dos Engenheiros Técnicos (OET), nem o novo Regulamento de Admissão e Qualificação da Ordem dos Engenheiros, sendo que esta proposta de diploma, ao empregar a mesma terminologia usada em 2009, resulta num acrescento de ambiguidade.
2. A PL227/XII, agora Decreto n.º 334/XII da AR, revê uma Lei (a n.º 31/2009, de 3 de julho) cuja implementação ainda não atingiu maturidade, verificando-se, quer já em 2009, quer nesta revisão, uma crescente ocupação do espaço de intervenção do Engenheiro por outros profissionais sem que, para tal, tenham a devida qualificação.
3. O processo de construir integra um ciclo de práticas e conhecimentos que envolve e relaciona decisões de planeamento, de conceção, de exploração e de manutenção, num contexto multidisciplinar, devendo assentar em estruturas normativas e regulamentares que reconheçam a sua dinâmica própria e a reforcem, o que as revisões agora propostas contrariam.
4. Trata-se de um documento que desqualifica o ato de construir, pela forma como o segmenta, assumindo como válidos atos individualizados e autónomos praticados por agentes que podem não ter as competências próprias. Constata-se, assim, uma atuação evidente na decomposição do conceito de projeto e do conceito de obra, desqualificando os resultados finais, estando em contraciclo com a necessidade de garantia de competência, de conhecimento e de segurança.
5. Regista-se uma manifesta perda de valor nas competências próprias e exclusivas dos Engenheiros e no seio das próprias especialidades de engenharia.
6. Perde-se a oportunidade de disciplinar o acesso à atividade, promovendo, contrariamente, a desqualificação técnica e a redução de exigências para o seu exercício.
7. Permite-se a realização de atos de engenharia a profissionais sem a competente formação ou qualificação e retiram-se atos consagrados desde sempre:
a) Engenheiros Civis que há mais de 40 anos vêm exercendo de forma competente a elaboração de determinados projetos de arquitetura e tendo, com base nessa atividade, constituído as suas empresas e desenvolvido a sua carreira profissional, deixaram de o poder fazer, sem que se vislumbrem razões de conhecimento e competência profissional para que tal acontecesse;
b) Aliás, parte significativa dos Engenheiros Civis que iniciaram os seus cursos até ao ano letivo de 1987/1988, no que concerne à elaboração de determinados projetos de arquitetura, estão protegidos pela Diretiva n.º 2005/36/CE, do Parlamento e do Conselho, transposta para o Direito interno pela Lei n.º 9/2009, de 4 de março, não se compreendendo que a Lei n.º 31/2009, agora revista pelo Decreto n.º 334/XII (anterior Proposta de Lei n.º 227/XII, que, durante mais de três meses os contemplou), deixou, na véspera da sua aprovação na Assembleia da República, a 12/03/2015, de os considerar. Aliás, tal configura uma situação de discriminação inversa porque (e por exemplo):
Um Engenheiro português com título de formação previsto no Anexo VI da Diretiva n.º 2005/36/CE, do Parlamento e do Conselho, de 7 de setembro, e Anexo III da Lei n.º 9/2009 de 4 de março, pode exercer esta atividade no âmbito da arquitetura em qualquer outro Estado-membro da União Europeia, ao mesmo tempo que lhe é vedada essa mesma atividade no próprio Estado (Português) da sua nacionalidade e formação. Tal pressupõe, assim, desigualdade de tratamento e discriminação negativa;
c) É reconhecida autorização aos arquitetos que vão poder exercer direção e fiscalização de obras, bem como execução de trabalhos nas diferentes especialidades de engenharia até ao valor de 5,5 milhões de euros, sem que na sua formação de base tenham preparação científica e técnica para o efeito, pelo que não podem estar qualificados, como nunca estiveram, para estes atos de engenharia;
Sintetizando, adota um caminho de retrocesso que desqualifica, decompõe, desintegra e fragmenta o ato de construir, retirando à sociedade a capacidade de exigir do setor da construção o mérito, a responsabilidade, a segurança e a eficiência que se impõe.
Face aos motivos expostos e nos termos do disposto no artigo 52.º da Constituição e da Lei n.º 43/90, de 10 de agosto, alterada pelas Leis 6/93, de 1 de março, 15/2003, de 4 de junho e 45/2007, de 24 de agosto, que a republica, os cidadãos a seguir identificados vêm pedir ao Senhor Presidente da República que não promulgue os Decretos n.º 333/XII e n.º 334/XII, dimanados da Assembleia da República.